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Crônica

A Estátua da Responsabilidade e o Poder Moderador


A Estátua da Responsabilidade e o Poder Moderador - Gente de Opinião

Nos meus tempos de faculdade presencial, nos idos das décadas de 1960/1970, tínhamos, durante o ano letivo, praticamente 4 meses de férias – para nós, os sertanejos interioranos − era o tempo do retorno ao rincão de origem, tempo de rever a família, arranjar namorada, participar dos festejos juninos, de conviver com os amigos, mas nem tudo era festa. Férias para mim e um restrito grupo de amigos, significavam estudos extracurriculares, leituras compartilhadas, discussões filosóficas, etc. O nosso bunker intelectual era a casa de um dos colegas, pertencente à família Militão, éramos seis, destemidos pensadores, e por isso, sujeitos ao bullying da sociedade, comprometida com o poder e o ter.

Vivíamos ao sabor do existencialismo, época dos sovacos ilustrados, com as obras de Sartre, Simone de Beauvoir e Marcel Proust – Em Busca do Tempo Perdido − um dos melhores livros que li na juventude − cheio de frases de efeito, sementes que germinaram durante a caminhada em busca de sentido, de propósito para a existência: “Os paraísos perdidos estão somente em nós mesmos.”

O sentido da vida, para nosso pequeno grupo, era evoluir, melhorar e harmonizar. A nossa angústia existencial acabava quando trocávamos textos e exercíamos a crítica sincera e honesta, ou empreendíamos passeios pelas serras do município e preenchíamos o vazio existencial, ouvindo o eco da própria voz, como resposta do dicionário de ideias aos nossos questionamentos juvenis, oriundos da leitura constante, numa época em que não existia celulares nem internet. Eu sou, sou, sou, ou, ou, ou… Eu faço, aço, aço… Eu vou, ou, ou…

Aprendemos com a reflexão que o livre arbítrio cristão libertava a divindade, do determinismo inerente – se é todo poderoso, me criou, e sabe para onde vou. Para onde foi meu livre arbítrio? Daí abandonamos o criacionismo e enveredamos pelos caminhos e descaminhos do evolucionismo – no início da vida era apenas uma célula, daí ela se partiu e deu continuidade a outras em progressão geométrica, até que surgiram a flora e a fauna, inclusive o homem e sua Odisseia no Espaço, acompanhando a evolução da linguagem, no seu magnífico cérebro, cheio de alternativas libertárias.

O tempo da vida difere do tempo da evolução, por isso muitas respostas foram apagadas pela esponja do tempo. Hoje a gente tem quase certeza, que o sentido da vida é o sentido biológico da célula, a multiplicação conforme o devir genético, até que a finitude humana se dilua em chips do conhecimento e o propósito da existência seja acondicionado na AI, sob o império da verdade absoluta e infinita do cosmos. “O Niilismo não afirma que não existe nada, mas que tudo é desprovido de sentido. Não há um grande propósito no universo. O universo é, simplesmente. Não há sentido particular na decisão que você tomar hoje com relação a como agir”. O ser humano se determina a si mesmo.

A busca pelo sentido da vida já rendeu muitas laudas em inúmeras línguas ao longo do universo, já esmerilhou milhares de neurônios de pensadores renomados, mas nenhuma palavra do vernáculo humano foi tão desgastada como liberdade, quer seja em oposição à prisão, quer seja em termos do comportamento genuinamente humano.

O ser humano tem a liberdade de mudar a qualquer momento e o faz com respaldo nos guardados do passado, mas tem consciência que a liberdade individual permanece essencialmente imprevisível. Simone de Beauvoir dizia que o homem é livre, mas encontra a lei na sua própria liberdade.

Ultimamente muito se tem falado em liberdade de expressão, paradoxalmente protegida e desrespeitada por membros do legislativo e do judiciário, chegando-se ao risco de corromper a semântica, arbitrariamente, em proveito próprio, esquecendo-se da íntima relação de liberdade com responsabilidade. Antoine de Saint Exupéry dizia que Ser homem é precisamente ser responsável.

O neuropsiquiatra Viktor Emil Frankl, austríaco e fundador da terceira escola vienense de psicoterapia, a Logoterapia e Análise Existencial, defendia a ideia da construção de uma Estátua da Responsabilidade, na costa oeste americana, como complementação à Estátua da Liberdade, localizado na Costa Leste. O projeto está em andamento pela família do renomado e falecido escritor. Sem sombra de dúvidas a liberdade é o esteio para o reconhecimento da dignidade e da capacidade humana, mas é interativa, logo, sem a responsabilidade, pode rapidamente enveredar pelo egoísmo e pela prevaricação.

No Brasil, a simbologia da Estátua da Responsabilidade, embutindo o Poder Moderador, caberia como uma luva, no espaço físico/ideológico dos três poderes republicanos, evidentemente que a responsabilidade nasce da consciência e alimenta-se da moral, o que justifica uma ação moderadora, para com o bem comum, menos devastadora e mais construtora, como se uma Espada de Dâmocles pairasse sobre os descaminhos de qualquer um dos poderes listados na Constituição Federal. 

Que tal a Estátua da Responsabilidade, modernizando a doutrina de Montesquieu,  na praça dos três poderes, que, no Brasil, seriam quatro. Como sugestão, o referido Monumento Moderador poderia simbolizar uma força maior e independente, escorada nos militares, uma espécie de Politburo Ocidental, que estaria sempre lembrando aos membros dos outros poderes: vocês são livres, mas andarão dentro dos meus limites, para não caírem na tentação dos atos irresponsáveis, que florescem nos jardins da liberdade, sem o controle da razão e da sensatez, ainda que com o respaldo de alguma lei.  Alguns diriam, assim ficaria parecido com a Coréia do Norte, a China, Putin. Outros afirmariam, isso é o arcabouço de uma ditatura nazista de direita. Enfim, a Responsabilidade atemoriza os dois lados do exercício do poder, contudo não pode ser esmagada pelo romantismo nacionalista, muito menos pelo egocentrismo e vaidade humanos. 

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