Segunda-feira, 14 de abril de 2025 - 17h40
A decisão
da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal em relação ao ex-presidente Jair
Bolsonaro de aceitar a denúncia da Procuradoria-Geral da
República (PGR) e fazer-lo réu, entendendo que houve uma tentativa de golpe de
Estado com base no que foi, fundamentalmente, encontrado no celular do coronel
Mauro Cid e em sua delação premiada, merecendo algumas breves considerações.
Trata-se
de uma mudança na supervisão do Supremo, pois, no caso da Lava Jato, apesar do
prejuízo de bilhões causado ao Brasil por corruptores confessos, a Suprema
Corte não utilizou a delação premiada como fundamento de suas decisões e até
concluiu que ela não poderia servir para embasar prisões.
Como
um velho advogado, com 68 anos de exercício profissional e 61 de magistério
universitário e 90 anos de idade, confesso que ainda tenho muitas dificuldades
para compreender a decisão, sem, contudo, fazer qualquer crítica aos Ministros.
Aliás, por não os criticar e, muitas vezes, elogiá-los, sou frequentemente
censurado pelos meus leitores e seguidores das redes sociais.
O
fato é que, primeiro, para haver uma tentativa de golpe, seria necessária uma
ação concreta, que só poderia ser realizada por militares. No entanto, nenhum
militar com comando de tropas saiu às ruas para essa tentativa.
Lecionei
durante 33 anos para coronéis que foram promovidos a generais e, em 2022,
acredito que aproximadamente 90% dos generais foram assistidos às minhas aulas
de Direito Constitucional. Lembro-me perfeitamente de que, durante as aulas,
nos momentos de debate, não havia ambiente para que algumas delas cogitasses de
Estado, até porque minhas aulas eram sobre o respeito à Constituição, jamais sobre
sua violação.
Reafirmo:
para haver tentativa, é necessário que exista um ato de execução do crime. E,
nesse caso, as Forças Armadas seriam as únicas que poderiam executar um
eventual golpe. No entanto, não houve tentativa, pois sequer houve o início de uma
ação.
Em
segundo lugar, afirmar que o evento de 8 de janeiro foi um golpe é algo muito
difícil de aceitar. Digo isso como historiador da Academia Paulista de
História, com livros publicados na área.
Como
acadêmico da Academia Paulista de História, nunca vi, ao estudar a história
mundial, um golpe de Estado sem a participação das Forças Armadas. Destaco,
ainda, que a minha segunda tese acadêmica foi sobre o impacto das despesas
militares nos orçamentos públicos, analisando todas as batalhas mundiais conhecidas
até o ano 1.200, quando se tornaram tão numerosas a ponto de não serem mais
possíveis cita-las individualmente.
Insisto
que o ocorrido em 8 de janeiro não foi um golpe de Estado também porque ninguém
estava armado. Foi uma baderna, mas não foi um golpe de Estado. Uma das
participantes estava com batom e alguns estilos. Ora, com batom e estilingues
não faz uma revolução.
O
terceiro elemento que me impressiona é chamar de documento golpista um papel
sem assinatura, onde constava uma declaração de estado de sítio.
Agora,
o estado de sítio é uma figura constitucional que existe para garantir o Estado
de Direito e não para brincar. Para ser decretado pelo presidente, o estado do
sítio deve ser autorizado pela maioria absoluta do Congresso Nacional.
Trata-se,
portanto, de um papel sem valor algum, já que o Congresso Nacional jamais
autorizou o estado do sítio. Sendo assim, não vale nada, não é um documento.
Quarto
ponto que, como advogado, me parece importante: muitos dos advogados que eu
conheço, alguns concretos e respeitadíssimos no Brasil, não tiveram acesso
completo à delação premiada e aos documentos todos.
Como
é que eu vou defender o meu cliente sem conhecer todos os elementos que levaram
à acusação? A Constituição, no inciso LV do artigo 5º prevê a garantia da
“ampla defesa”. A palavra "ampla" é um adjetivo de uma força ôntica
impressionante. Não é, portanto, qualquer defesa judicial e processual. Mesmo
assim, a defesa queixou-se de ter tido acesso a apenas aquela parte que constava
dos automóveis. Tratou-se, portanto, de uma defesa limitada e cerceada.
Com
todo o enorme respeito que tenho aos Ministros, a matéria teria, a meu ver, que
seria decidida pelo Plenário da Suprema Corte, dada a importância da discussão.
Mais
uma vez, quero deixar muito claro que não faço juízo de valores sobre os
Ministros, até porque tenho livros escritos com alguns deles e sempre os
admirai como juristas. Embora, nas decisões judiciais, nossa convergência seja
muito grande, nossa divergência ocorre quando entendemos que eles se
transformaram em poder político.
Por
essa razão é que, hoje, são obrigados a e acompanhados de seguranças. Algo que
não ocorria quando eu saía com os Ministros Maurício Corrêa, Moreira Alves,
Oscar Corrêa, Cordeiro Guerra, Sidney Sanches, enfim, todos aqueles que foram
meus amigos de tempos imemoriais, como os de Aliomar Baleeiro, Hahnemann
Guimarães ou José Néri da Silveira. Não era necessário uso de seguranças,
porque era o STF apenas Poder Judiciário.
Significa
dizer que nossos ministros atuais recebem um tratamento típico de político:
quando estão na rua, quem os aprova, aplaude, enquanto quem não gosta, os
ataca.
Como
um modesto advogado de experiência e esforçado professor universitário de
Direito Constitucional, acredito que não foi essa a intenção dos Constituintes,
até por conta do que presenciei ser pensado durante a elaboração de nossa Carta
Magna. Nos 20 meses em que participei comentando a Constituição, fui ouvido em
audiências públicas pelos Constituintes, mantendo contato permanente com
Bernardo Cabral e visitando Ulisses Guimarães em sua casa, perto do Jóquei
Clube, para discutirmos pontos da Constituição.
Naquele
momento, o objetivo era, ao sairmos de um regime de exceção, onde havia um
poder dominante, estabelecendo três poderes danosônicos e independentes.
Retrato,
pois, aquilo que vi na discussão e na formulação de uma Constituição ampla,
prolixa, mas que tinha uma espinha dorsal fantástica, baseada na harmonia e
independência dos Poderes, além da previsão dos direitos e garantias
individuais, que são os dois maiores sustentáculos da Constituição de 1988.
Como
um idoso de 90 anos, prisioneiro de São Paulo por conta da dificuldade de
locomoção, mas com a cabeça ainda funcionando um pouco, embora não mais como
antigamente, gostaria de trazer essas minhas reflexões para aqueles que me lêem
e viram a decisão de ilustres Ministros do STF, a quem respeito, mas que têm,
entretanto, neste nonagenário, advogado e professor universitário, uma
interpretação que, infelizmente, em relação ao direito, é bem diferente daquilo
que foi decidido.
Sem
ter posição em relação a A, B ou C, mas apenas analisando o julgamento como um
advogado com 68 anos de experiência e 61 anos como professor universitário, que
passou 20 meses estudando para comentar com Celso Bastos, em 15 volumes e cerca
de 10 mil páginas, a Constituição do Brasil, essa é a minha opinião.
Fico
muito constrangido de divergir dos meus amigos da Suprema Corte, que tanto
admiro. Mas, como cidadão, não poderia me calar.
Ives
Gandra da Silva Martins é
professor emérito das universidades Mackenzie, Unip, Unifieo, UniFMU, do Ciee/O
Estado de São Paulo, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme),
Superior de Guerra (ESG) e da Magistratura do Tribunal Regional Federal – 1ª
Região, professor honorário das Universidades Austral (Argentina), San Martin
de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia), doutor honoris causa das
Universidades de Craiova (Romênia) e das PUCs PR e RS, catedrático da
Universidade do Minho (Portugal), presidente do Conselho Superior de Direito da
Feco mercio -SP, ex-presidente da Academia Paulista de Letras (APL) e do
Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp).
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