Sexta-feira, 13 de junho de 2025 - 14h49
Duas
fontes de energia elétrica são essenciais, com papéis decisivos na matriz
energética mundial descarbonizada: a energia solar e eólica. A grande vantagem
é que são fontes renováveis, baratas, inesgotáveis e abundantes. E não é pelo
fato de serem fontes renováveis, não emitindo gases de efeito estufa (CO2) e
gases poluentes durante o processo de transformação/conversão, que podem ser
chamadas de “limpas”. A ciência, os cientistas, revelam que todo processo de
geração de energia provoca danos e impactos socioambientais e econômicos.
Portanto, é errôneo associar energia renovável à “energia limpa”, à “energia
verde”, à “energia de baixo impacto ambiental”. Sem
ciência não tem futuro, não existe energia limpa.
Ao
denominar equivocadamente/deliberadamente de fontes limpas, a legislação
vigente considera que são de baixo impacto ambiental. E, para efeito de
licenciamento da obra, é suficiente apresentar o Relatório Ambiental
Simplificado (RAS), que como o nome já diz é simplificado. Assim, exime o
empreendedor de apresentar estudos mais aprofundados e detalhados sobre
possíveis danos ambientais e possíveis soluções.
Ao
utilizar tanto a energia solar fotovoltaica, como a energia eólica para
produzir energia elétrica, duas lógicas de produção são possíveis. A geração
centralizada, com grandes áreas ocupadas para captação, geração e
transmissão de energia elétrica em larga escala, em centrais, complexos,
parques e usinas. E a geração distribuída ou descentralizada, que gera
energia em menor escala, com os equipamentos ocupando pequenas áreas
(residências, fachadas, tetos, coberturas em geral), com uma produção local
destinada prioritariamente ao autoconsumo.
No
Brasil, para cada uma destas fontes energéticas, a realidade dos modos de
produção é distinta. Enquanto na produção eólica, 100% da potência instalada
corresponde a geração centralizada; no caso da energia solar fotovoltaica, 32%
equivale a geração centralizada, e 68% a geração distribuída.
É no
Nordeste que estão localizadas mais de 85% das instalações eólicas do país
(total aproximado de 1.100 parques), ocupando áreas costeiras e sertanejas
(bioma Caatinga), preferencialmente em locais de altitude. O aumento
desenfreado desta fonte de energia elétrica nos últimos 15 anos, levou ao patamar
de terceira fonte mais importante da matriz elétrica nacional, com 33,7
GigaWatts (GW) de potência instalada.
A
potência total instalada de energia solar fotovoltaica, atingiu a marca de 55
GW, com 37,4 GW de geração descentralizada (incluindo sistemas de pequeno e
médio porte de geração própria), e 17,6 GW de capacidade operacional de grandes
usinas centralizadas, conectadas no Sistema Interligado Nacional. Já a energia
solar ocupa a segunda posição na matriz elétrica nacional, vindo após a hidrelétrica.
Segundo a Associação Brasileira de Energia Solar, ainda uma parcela modesta das
93 milhões de unidades consumidoras cativas são beneficiadas com a geração
distribuída, em torno de 5 milhões de unidades.
O crescimento
vertiginoso, desordenado, de ambas fontes renováveis ao longo dos últimos anos,
somado com a energia hidrelétrica, posiciona o país como um dos que mais
utiliza as fontes renováveis de energia no mundo alcançando 88,2% de toda
potência instalada, de aproximadamente 220 GW. Mesmo sendo altamente desejável
e necessária nos dias atuais de emergência climática, o uso de fontes
renováveis com produção centralizada, tem provocado consideráveis danos
socioambientais e econômicos, que não podem e não devem ser ignorados,
desmistificando assim a denominação de “energia limpa”.
O modelo
de negócio para expandir os negócios eólicos/solares voltados à produção
industrial de energia tem-se mostrado insustentável, não conseguindo gerar
benefícios locais, e no território onde são implantados. Ao contrário, afetam
diretamente o modo de vida das comunidades. A natureza é sacrificada pelo
desmatamento de áreas da Caatinga comprometendo a produção agrícola familiar e
a criação de animais. A saúde dos moradores é afetada pela chamada Síndrome da
Turbina Eólica (conjunto de sintomas relatados por pessoas que vivem próximo de parques eólicos, como perda de audição, enxaqueca,
tontura, irritabilidade, dificuldade de concentração, distúrbios do sono e
transtornos de ansiedade e pânico) causada pelo ruído e vibrações incessantes
provocados pelas torres eólicas localizadas perto das casas, dos currais e
galinheiros.
A
instalação da infraestrutura de energia renovável, os parques eólicos e usinas
solares, frequentemente ocorre em territórios tradicionais onde vivem
comunidades da agricultura familiar, quilombolas, populações indígenas,
moradores de “fundo de pasto”, ribeirinhos que vivem da pesca artesanal, e
outros moradores de áreas dispersas no semiárido, e em regiões costeiras,
historicamente anônimos, marginalizados e vulnerabilizados.
Têm sido constatadas perdas
significativas da cobertura vegetal do bioma Caatinga associadas aos megaprojetos com fontes renováveis, que já podemos atribuir como mais um dos vetores do
desmatamento do bioma somados ao agronegócio, pecuária e mineração. A ciência tem
apontado o desmatamento como uma das principais causas do aquecimento global, o que no Nordeste resulta na diminuição das chuvas, com
secas mais intensas trazendo danos ao solo, o assoreamento de brejos e o
comprometimento das nascentes de rios, gerando prejuízos socioeconômicos.
Destacamos que no processo de obtenção da área para instalação
dos equipamentos das usinas, dos complexos, sem transparência nas informações
sobre os propósitos e as consequências dos empreendimentos solares e eólicos,
não existindo consulta prévia junto aos que vivem na terra há muitas gerações.
Muitos assinam contratos de cessão de uso de suas propriedades sem qualquer
assistência jurídica, cedendo 100% de suas terras em contratos de 30 a 50 anos
de duração. O que pode provocar perdas de direito de “segurado especial” dos
agricultores e agricultoras, quando de sua aposentadoria, e de acesso à
crédito. Além da perda da própria terra, expropriação, como consequência de
clausulas draconianas contidas nos contratos de arrendamento.
Neste
“negócio” sobressai o protagonismo de grandes
corporações estrangeiras que acabam monopolizando o território e os recursos
naturais, especialmente a terra e a água. É recorrente que empresas contrariam
os princípios e normas internacionais estabelecidos em tratados para proteção
dos Direitos Humanos e do modo de vida de populações tradicionais, bem como os
princípios orientadores sobre negócios e direitos humanos das Nações Unidas.
Consideremos
também as facilidades proporcionadas pela frouxidão da legislação ambiental, as práticas de ações e omissões lesivas de órgão
públicos e de autoridades que insistem em ignorar e se
omitir diante dos impactos negativos das instalações. Na realidade, não entregam os avanços e melhorias prometidas. Ao contrário, vitimam povos indígenas, agricultores
familiares, populações costeiras, atingidas direta ou indiretamente pelos
impactos das instalações dos complexos eólicos e usinas solares de grande
porte. Além de provocarem deslocamentos dos
moradores, com a desterritorialização e a perda de modos de vida das comunidades, aumentando a
desigualdade social no país.
Estudos
realizados por pesquisadores e cientistas das Universidades Federais de
Pernambuco, Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba e da Bahia, têm escancarado os
diversos problemas causados por estas grandes instalações. Organizações não
governamentais, igreja, sindicatos, organizações de moradores têm acompanhado e
se unido aos atingido, nas denúncias em manifestações de rua, ocupando órgãos
públicos, apelando ao Ministério Público, à Defensoria Pública da União, aos
Conselhos Estaduais de Meio Ambiente, e participando de audiências públicas.
Todavia é
muito grande a coerção exercida pelas empresas eólicas e solares e seus
poderosos lobbies, apoiadas pelos governos estaduais e municipais, para abafar
as reclamações e denúncias. É necessário a pressão popular para responsabilizar
as autoridades municipais, estaduais e federais pela omissão diante de
violações de direitos humanos e violações socioambientais de conhecimento
público.
O clamor
vigente da sociedade exige que o modo de produção de energia, em escala
industrial, com fontes renováveis, não seja imposto às custas dos danos
causados ao meio ambiente e aos direitos das comunidades afetadas, que acabam
se tornando vítimas.
A
sustentabilidade na geração de energia com fontes renováveis deve privilegiar o
modelo de produção local, nas proximidades dos pontos de demanda, gerando
localmente de acordo com suas necessidades. A investida atual das empresas
volta-se para a instalação de usinas eólicas offshore, no mar territorial que
está prestes a ser leiloado para que empresas estrangeiras instalem grandes
usinas eólicas, sem que o planejamento estatal leve em conta as comunidades
tradicionais, reproduzindo assim práticas colonialistas inaceitáveis.
Outros
caminhos, escolhas e decisões são possíveis. A mobilização coletiva é essencial
para garantir que os atores envolvidos adotem ações efetivas e urgentes,
assegurando um futuro sustentável para todas as formas de vida!
___________________
* Professor associado aposentado da Universidade Federal de
Pernambuco, graduado em Física pela Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP/SP), mestrado em Ciências e Tecnologias Nucleares na Universidade
Federal de Pernambuco (DEN/UFPE) e doutorado em Energética, na Universidade de
Marselha/Aix, associado ao Centro de Estudos de Cadarache/Comissariado de
Energia Atômica (CEA)-França.
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