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Viriato Moura

INCÔMODOS DE SER MÉDICO



Ser médico como deve ser, exige virtudes inerentes a poucos seres humanos. Posso afirmar isso com todas as letras e com convicção porque não o faço apenas por ter ouvido falar, ter lido em muitas publicações, ter aprendido com muitos mestres. Asseguro essa assertiva embasado na vivência de 40 anos como médico.

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Ser médico provoca incômodos diversos. Sim, dói, e não é pouco. E por doer tanto por vezes, exige  daqueles que optam por essa profissão que estejam preparados; ou seja, que tenham limiar de dor que suporte sofrimentos a ponto de não levá-los ao desespero e a consequente desistência, que provoca a   banalização do sofrimento e da morte de seu semelhante.

 O fato de alguém escolher ser médico, não atesta sua boa índole. A decisão pode ter sido motivada por  pressupostos avessos aos exigidos para a correta prática da medicina. Se assim for, o resultado não será um médico, mas um espectro de médico, que chega a ser uma ameaça àqueles que assiste.

Valho-me de uma lapidar citação de T.R. Harrisson, autor de um clássico compêndio sobre Medicina Interna, para expressar a dimensão do que é verdadeiramente ser médico: “As maiores oportunidades, responsabilidades ou obrigações que podem recair sobre um ser humano consistem em ser médico. Para tratar de um doente, ele necessita de habilidade técnica, conhecimento científico e compreensão humana. Empregando esses atributos reunidos à coragem, humanidade e prudência, ele proporcionará um serviço único aos seus semelhantes e contribuirá para a formação sólida de seu próprio caráter. O médico não deve pedir mais do que isso ao seu destino e nem se contentar com menos”.

Convenhamos que encontrar todas essas virtudes em uma pessoa não é  fácil. A natureza humana, por mais desolador concordar com isto, não é pródiga em gente assim.

Os incômodos sentidos pelo médico – e posso falar deles porque já os senti muitas vezes – nem sequer devem ser externados aos pacientes ou aos seus. Temos de sofrer calados, questionando-nos  mentalmente o tempo todo. Se expressarmos nosso sofrimento, poderemos ser interpretados como inseguros, como se estivéssemos com peso na consciência por termos falhado. Como se sabe, sofrer calado faz a dor ainda mais intensa.

Os padecimentos do médico no contexto do exercício de sua profissão nem sempre decorre da dúvida em relação a sua conduta diagnóstica e terapêutica, porém é um forte indício de que está preocupado com seu paciente, muitas vezes até mesmo  antes de ter decidido  tratá-lo. Diferente dos irresponsáveis, desumanos e levianos, que geralmente são protegidos por altas doses de endorfina capazes de imunizá-los  contra o sofrimento dos outros.

As aflições que os médicos éticos e humanitários sentem provocadas por suas angústias diante dos pacientes que tratam, geralmente resultam de sua insipiente formação, das limitações da ciência que praticam, da evolução inexorável  de algumas doenças em direção à sequela ou à morte, e até de condições e infortúnios diversos nem sempre solucionáveis em tempo hábil.

Uma pergunta que não deve calar: quantas vezes a mídia ou as pessoas em geral já se ocuparam de tratar destes assuntos: a humanidade dos médicos, suas necessidades, seus incômodos etc.? O contrário é a regra: uma simples suspeita de erro médico já é razão de grande exposição ofensiva, de pré-julgamentos sumários. Precisa-se de um culpado para vingar alguma suposta vítima.

Aqueles que injustamente disseminam desconfiança generalizada em relação aos médicos estão prestando um desserviço à sociedade e a si mesmos. Somente os médicos cuja conduta provoca danos a seus pacientes devem ser motivo de providências cabíveis, inclusive no âmbito dos conselhos de ética e da  justiça. Somente esses. Porque confiar no médico tem, em muitas situações – eis um exemplo de efeito placebo! –, maior   poder melhora e cura do que os remédios que ele prescreve e os demais procedimentos terapêuticos que executa. Ao ver o médico com desconfiança, o paciente suprime parte importante de suas possibilidades de cura.  Uma reflexão sobre isso se impõe. E uma mudança de atitude, também.

Textp atualizado hoje (24) às 14hs).

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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