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Paulo Saldanha

CRÔNICAS GUAJARAMIRENSES - Não era o muro de Berlim, mas o da esquina da Pinheiro Machado com Gonçalves Dias


CRÔNICAS GUAJARAMIRENSES - Não era o muro de Berlim, mas o da esquina da Pinheiro Machado com Gonçalves Dias - Gente de Opinião

“Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem: pisam as flores, matam nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada.”

Eduardo Alves da Costa

         Em 1961, os comunistas da antiga União Soviética, de mãos dadas com os da Alemanha derrotada, ergueram um muro na Berlim Oriental, separando famílias e amigos daqueles que iriam viver na parte ocidental, dividindo o mundo em dois pedaços.

         Depois, já quase no final do ano de 1989, em 9 de novembro para ser preciso, caía o muro erguido em Berlim, um dos marcos da Guerra Fria, após o naufrágio da ideologia comunista no mundo.

         Não tenho poderes nem a pretensão de dar início a uma Guerra Fria como aconteceu entre Moscou e Washington; mas, como cidadão, ouso ponderar que a história rondoniense foi vilipendiada mais uma vez, em face das distrações dos moradores novatos que se inseriram na sociedade da terra sem ânimo de tentar, pelo menos, discutir o porquê, o como e o quando dos acontecimentos históricos da região, mediante a omissão e a negligência dos nossos historiadores.

         Refiro-me ao glorioso passado do Ypiranga Esporte Clube, justamente na confluência das ruas Pinheiro Machado com Gonçalves Dias, que desapareceu para ser erguido um prédio de arquitetura modernosa, mas que ao menos homenageia um ínclito nome, uma legenda moral e uma grife do Judiciário regional, o saudoso Doutor César Montenegro, substituindo naquele espaço o também honrado nome do Coronel Paulo Saldanha.  Soa como uma passagem do bastão!

E aqui transcrevo as palavras que um lúcido escrevinhador registrou para a posteridade, assinalando: “Nesses 97 anos de existência, o clube teve na cadeira da presidência diversas personalidades importantes para o cenário histórico de Rondônia, como: Joaquim Augusto Tanajura, George Adolhhue Mackenzie, Alexandre Albert Guimarães, Paulo Cordeiro da Cruz Saldanha, Aluízio Pinheiro Ferreira, Albertino Lopes, Moacir Taborda de Miranda, Abguar Lima de Miranda, Sebastião Nascimento Lapa, Waldyr Estrela Cabral, Manoel Messias Paula de Sá, Dr. Luiz Augusto Paiva Cardoso, Olívio Leite Salomão, Antônio Edson Andrade, Raimundo Nonato Serrati, Clóvis Avanço, Alfredo Pessoa Corrêa, Aluízio Bentes”.

Primeiro derrubaram o Estádio e seu muro; e em dias que não posso precisar, a fachada do antigo Estádio do Ypiranga Esporte Clube, construído pelo meu tio-avô, Paulo Cordeiro da Cruz Saldanha, o também ínclito nome, respeitabilíssimo, um edificador nestas paragens do poente, desde muito antes da frase se tornar parte do nosso hino.

Derrubaram o muro e a fachada do antigo Ypiranga, mas não derrubarão a trajetória de um homem que fez história em Guajará-Mirim, Porto Velho, Boa Vista e Manaus, pois sendo morador em Guajará-Mirim mereceu a ventura de administrar na cidade de Porto Velho, como seu quarto Presidente, o Ypiranga Esporte Clube, quando foi entregue o Estádio que levava o seu nome. E foi além: por ter construído a primeira escola de Guajará-Mirim e trazido de Manaus o seu primeiro professor, o educador Carlos Costa; mandado edificar às suas expensas a primeira igreja católica na fronteira, ainda em 1926; depois, apoiado as ações cívico-político-administrativas e religiosas do Bispo Dom Francisco Xavier Rey, este que se fez presente a partir de 1932. E, qual “médico ad hoc”, ante a falta de profissionais dessa área, pôde minorar o sofrimento de tantos, tratando, como se profissional da saúde fosse, os doentes das enfermidades tropicais.

Também agenciou o progresso e o desenvolvimento implantando a Guaporé Rubber Company, promovendo a harmonia entre os dois povos fronteiriços quando a cobiça alfandegária extrapolava a razoabilidade.

 Inclusive se deve à liderança dele, e não à do Aluízio Ferreira, a iniciativa de pugnar pela criação do Território Federal do Guaporé, porém com sede em Guajará-Mirim, ainda em 1937, no que foi apoiado maciçamente pela ordeira população lindeira. Faço notar que jamais negarei a importância política e administrativa do Coronel Aluízio Ferreira na implantação do Território, posto ter agido com competência e denodo.

O que sobrou do muro da Gonçalves Dias com a Pinheiro Machado foi derrubado. Porém não será criada uma cortina de ferro quanto à história desse espaço, fazendo cair junto com o muro uma parte do passado desta terra. E, por outro lado, a História não deixará cair no esquecimento a trajetória futebolística de um Simeão Tavernard, Mário Teixeira, Nélio e Nézio Guimarães, Baby, Chafon, Gervásio, Bacu, Ney Barbosa, Simão Salim, Walter Santos, Carlos Alberto, Tracajá, Alcimar, Meireles, Bacurau, Edu e tantos outros que desfilaram seus talentos no Estádio de Futebol Paulo Saldanha.

Em nome do progresso mais um espaço histórico silencia; todavia, a história de vida do coronel Paulo Saldanha, a despeito da distração, omissão e negligência de uns e outros, segue irretocável e irretorquível, plena de exemplos edificantes e de fecundo amor a esta terra...

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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