FIDELIDADE TEM SEU PREÇO

                Felipe Azzi
 

                Justificativa que DORINHA DOS ANJOS deu para a sua comadre JACILDA AMOROSO, para explicar o “galo” ostentoso na cabeça de seu marido, GOÉRGES PASCOAL DOS ANJOS.

                 – O cretino deu de aparecer em casa, depois da meia noite, revestido desse ou daquele figurão. Só de Giuseppe Strompanatto, um barítono italiano da Comédia Veneziana, veio três vezes. Acordei com os ouvidos estropiados por um ronco muito parecido com a descarga de automóvel sem silencioso. A tranca da janela mais próxima teve a sua serventia.

                JACILDA, sem demonstrar espanto, retrucou:

                – A comadre tem sorte! Pior é o que ULDERICO AMOROSO, meu marido, apronta. Já acordei várias vezes, altas horas da madrugada, ouvindo arranhões nas portas e janelas, como onça pintada faz em tarefa de afiar as garras. Levanto e vejo pela fresta da janela o maluco do ULDERICO fantasiado de lobisomem, com cabeleira e barba grandes, com um ancinho nas mãos, fuçando e, jeito de porco vadio, as partes de madeira da casa.

                E, completando:

                – Sujeito mais cismático e ensimesmado! Vai ser desconfiado assim na casa da velha!

                Na contagem da falta de sorte, DORINHA perdeu por oitenta decibéis a mais. Porém, ganhou dois estimados pontos acústicos nos ouvidos, como reparação da aparente surdez.