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Dom Moacyr

A Caminho da Páscoa


 

Neste Dia Mundial das Águas, a Campanha da Fraternidade nos convida a refletir sobre a violência contra a natureza. O meio ambiente também tem sido alvo da violência das pessoas. A exploração econômica sem critérios, a depredação da natureza, a situação em que se encontram as florestas, a poluição dos rios e das águas em geral, a contaminação do ar, a extinção de espécies vegetais e animais são resultantes da ação predatória dos seres humanos, são sintomas de grave doença que avança sobre nossa civilização. Hoje, estamos sofrendo sérias conseqüências das ações contra o meio ambiente como o efeito estufa, o aquecimento global, a indisponibilidade cada vez maior de água potável e o aumento dos diversos tipos de poluição nas grandes cidades. Tudo isso gera medo crescente em relação ao futuro e ao agravamento dessas conseqüências, o próprio planeta torna-se inseguro para todos (TB/CF 121-122).

Leonardo Boff no Texto-Base do 12º. Intereclesial das CEBs afirma que a situação mundial é de crise e não de tragédia. Estamos fazendo uma páscoa, uma passagem e travessia do local para o global, do nacional para o mundial, do indivíduo para a humanidade e da humanidade para a Terra e da Terra para o universo e do universo para Deus, a Fonte originária de todo ser. Há riscos, mas também grandes oportunidades de uma nova civilização mundializada e de uma nova relação de sinergia e benevolência para com a natureza e a Terra. O capital espiritual do cristanismo é fundamental para que essa travessia se faça com menos custos sociais e ecológicos e que seja bem sucedida. O Espírito acompanha cada etapa da aventura humana. Os cristãos tiram do anonimato esta presença misteriosa do Espírito, o nomeiam, o proclamam e o tornam consciente na palavra e na celebração. Se as Igrejas estiverem ausentes, faltará algo na nova fase planetária.

O nosso tempo é profundamente consciente da necessidade de se assumir uma responsabilidade coletiva, perante os males que afligem a humanidade. Paulo VI em uma de suas mensagens para a quaresma, escreveu que somente quando for satisfeita essa necessidade poderão ser remediados esses males. Em tal sentido a Quaresma mobiliza nossa atenção contra todas as formas de esbanjamento, e estimula a darmos as mãos num esforço conjugado. A restauração de todas as coisas em Cristo tem uma relação muito íntima com o espírito da Quaresma.

O profeta Isaias fala do Messias como o Príncipe da Paz (Is 9,1-5): tudo se realiza em Jesus. Ele é o Príncipe da Paz enviado por Deus para realizar a salvação da humanidade e a reconciliação de todos com o Pai. Desde o seu nascimento a sua vida é marcada pelo sofrimento e perseguição. Este ponto continuou na vida pública de Jesus de Nazaré. Ele foi traído, preso, julgado e executado em menos de 18 horas indo contra o Direito romano. O Príncipe da Paz afirma no alto da cruz: "Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem!"(Lc 23,34). Ele reconcilia todas as coisas, as da terra e as do céu (Ef 1,10).

A obra da reconciliação assumida por Jesus tem como centro o mistério da cruz. Essa é a maior expressão do amor vivido entre as pessoas humanas. Nela se dá o amor em plenitude do qual Jesus foi tudo para todos e para os outros. A cruz é a assunção da condição humana menos que o pecado. Jesus não buscou benefícios, vantagens mesmo nos milagres que realizava; tudo era em vista dos outros. Na cruz ele não tinha nada a não ser a vida dada pela salvação de todos: "Minha vida ninguém tira, eu a dou livremente"(Jo 10,18). Se nós queremos seguir a Jesus devemos renunciar a nós mesmos, tomar a cruz de cada e segui-lo(Lc 9,23). O critério de toda ação humana que nós fizermos deve ter como fundamento a pessoa de Jesus Cristo que nos exorta a amar os outros como ele nos amou (Jo 15,12). A ação de Jesus é paradigma do qual o mistério pascal é a maior expressão.

As condições ecológicas em que a criação subjaz em muitas partes do mundo suscitam justas preocupações, que encontram motivo de conforto na perspectiva da esperança cristã, pois esta compromete-nos a trabalhar responsavelmente na defesa da criação; de fato, na relação entre a Eucaristia e o universo, descobrimos a unidade do desígnio de Deus e somos levados a individuar a relação profunda da criação com a "nova criação" que foi inaugurada na ressurreição de Cristo, novo Adão. Dela participamos já agora em virtude do Batismo (Col 2, 12s), abrindo-se assim à nossa vida cristã, alimentada pela Eucaristia, a perspectiva do mundo novo, do novo céu e da nova terra..(SCa92)

A Campanha da Fraternidade deixa claro que a paz, para florescer, pressupõe um solo de justiça. Ou, como dizia Paulo VI na carta encíclica Populorum Progressio, publicada durante os anos sombrios da guerra fria, mais precisamente em 1967, "o desenvolvimento é o novo nome da paz". Numa palavra, o sonho da paz, talvez o mais profundo do ser humano, exige na expressão de Padre Alfredinho, que muitas pedras sejam removidas do meio do caminho. Entre elas, o acúmulo da riqueza e da terra em poucas mãos, o desequilíbrio das relações internacionais, a corrupção na área da política, a violação dos direitos humanos, as ditaduras abertas ou disfarçadas de democracia, as múltiplas agressões ao planeta Terra, a precariedade ou ausência dos serviços públicos: segurança, saúde, alimentação, educação, transporte, lazer, habitação.

A conversão, sobretudo a ecológica é uma urgência, pois não é mais "o gemido das criaturas" de que fala S.Paulo (Rom 8, 22),"mas dum espasmo de morte que tende a agarrar o próprio homem para o destruir" (PG 70).

A caminho da Páscoa, cada um de nós está ao mesmo tempo participando e colaborando na páscoa de todo o tecido social (marcado pelo grito silencioso dos que sofrem todo tipo de injustiças) e de toda a realidade cósmica (Rm, 8, 18-25), até à plena comunhão, quando Deus será tudo em todos (1Cor 15,28).

Deixemo-nos reconciliar com Deus!  O convite do apóstolo Paulo é a resposta ao nosso desejo de conversão. Para tornar a sociedade mais humana, mais digna da pessoa, é necessário revalorizar o amor na vida social - no plano político, econômico, cultural - fazendo dele a norma constante e suprema do agir. Se a justiça é, em si mesma, apta para servir de árbitro entre os homens na recíproca repartição justa dos bens materiais, o amor, pelo contrário, e somente o amor (e portanto também o amor benevolente que chamamos "misericórdia"), é capaz de restituir o homem a si próprio. Não se podem regular as relações humanas unicamente com a medida da justiça. Esta, em toda a gama das relações entre os homens, deve submeter-se, por assim dizer, a uma correção notável, por parte daquele amor que, como proclama S. Paulo, "é paciente e benigno", ou por outras palavras, que encerra em si as características do amor misericordioso, tão essenciais para o Evangelho como para o Cristianismo. Só a caridade pode transformar completamente o homem. Semelhante transformação não significa anulação da dimensão terrena em uma espiritualidade desencarnada. Quem crê poder conformar-se com a virtude sobrenatural do amor sem levar em conta o seu correspondente fundamento natural, que inclui os deveres de justiça, engana-se a si mesmo: A caridade representa o maior mandamento social. Respeita o outro e seus direitos. Exige a prática da justiça, e só ela nos torna capazes de praticá-la. Inspira uma vida de autodoação: "Quem procurar ganhar sua vida vai perdê-la, e quem a perder vai conservá-la" (Lc 17,33). (CIC 582-583)

Tampouco pode a caridade esgotar-se unicamente na dimensão terrena das relações humanas e das relações sociais, porque toda a sua eficácia deriva da referência a Deus: "Ao entardecer desta vida, comparecerei diante de Vós com as mãos vazias, pois não Vos peço, Senhor, que contabilizeis as minhas obras. Todas as nossas justiças têm manchas aos Vossos olhos. Quero, portanto, revestir-me da Vossa justiça e receber do Vosso amor a posse eterna de Vós mesmo.." (S.Terezinha)
A Caminho da Páscoa

Fonte: Pascom

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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