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Gente de Opinião

Crônica

O podcast como meio de comunicação


O podcast como meio de comunicação - Gente de Opinião

          Incrível como a escrita/leitura vêm perdendo espaços, no processo de divulgação e apreensão de conteúdos. Ao longo dos últimos anos, como se a visão estivesse cedendo espaço à audição, os jovens estão lendo menos, escrevendo quase nada, mas ouvindo muito. Recentemente uma pesquisa feita em vários países do mundo, descobriu que no Brasil, 66% dos jovens, entre 15 e 16 anos, não conseguem ler mais do que 10 páginas anuais, isso mesmo 10 páginas por ano. No Chile o normal é mais de cem.

            Só 9,5% dos estudantes brasileiros de 15 e 16 anos chegaram a ler algum material com mais de 100 páginas, em 2018 – índice muito inferior ao de outros países da América Latina, como Chile (64%), Argentina (25,4%) e Colômbia (25,8%). Em exemplos de nações reconhecidamente bem-sucedidas na educação, como a Finlândia, o patamar chega a 72,8%.

          O livro, os textos, para uso da visão, estão sendo superados pelo arquivo de voz, direcionados à audição; ainda que, em muitos casos, o arquivo de áudio, não passe de um texto lido. O atrativo é o público alvo de um texto gravado: milhares de jovens ouvintes, grudados, no dia a dia, ao fone de ouvido. Nunca a comunidade dos deficientes visuais se sentiu tão paparicada.

A escrita cuneiforme, os hieróglifos, o papiro, o alfabeto, foram algumas das primeiras vistas da janela da escrita, restritas à visão e ao tato, registrando manifestações consuetudinárias, colaborando com a memória e dando aos historiadores farto material de estudo. Com o aprimoramento do alfabeto, a invenção do papel e da prensa de Gutemberg, então, foi uma festa, a visão mandava e desmandava. Daí às gráficas modernas foi um salto extraordinário. Hoje estas mesmas gráficas estão em processo de extinção, cedendo espaço às telas de vídeo e aos arquivos de áudio.

No avanço de todas as civilizações, foi de suma importância o registro feito pela escrita. Imaginem quanto se perdeu e quanto teria se perdido dos ensinamentos orais de Sócrates, por exemplo, se Platão não tivesse registrado para a posteridade seus métodos e máximas! Praticamente todo o conhecimento humano, nos quatro cantos do Universo, foi registrado em livros, destinados à leitura, logo para o exercício do sentido da visão.

No passado recente, líamos um, dois e até três livros por semana e ainda discutíamos a qualidade do texto, o enredo, com colegas do mesmo nível. Atualmente a leitura é tida como cansativa, sonolenta e foi substituída por novelas, séries, filmes dublados e, principalmente, áudios. Quem tem o costume da leitura sabe que não é a mesma coisa. Semana passada, em visita ao escritório do Dr. Pedro Origa Neto, fiquei boquiaberto com a biblioteca particular do nobre advogado: vários ramos da literatura e do direito, calados, em centenas de prateleiras. Que desperdício, que falta faz ao dia a dia de um leitor onívoro, como eu. Parabéns, Pedro! Se eu fosse mais jovem iria lhe pedir um passe/frequentador!

Pela forma ímpar como, no mundo animal, o cérebro humano usa a fabulação, talvez, os inúmeros livros de ficção sejam copiados e colocados numa espécie de museu, e permaneçam, no mundo da inteligência artificial, como exemplos advindos do processo de imaginação da inteligência humana, fora dos padrões pragmáticos da “inteligência advinda do cérebro de hemisfério único” do futuro, onde, creio, só existirá espaço para o raciocínio, jamais para a imaginação.  

No início dos relacionamentos via grupos de whatsapp, o normal era digitar, aí as palavras foram sendo contraídas, resumidas, viraram emogis e, agora, a maioria dos participantes, simplesmente registra pela voz quaisquer ponderações, como se estivesse ao telefone. A voz e a audição tomaram conta do zap. A escrita passou a ser uma segunda opção.

Hoje todas as mídias não se cansam de falar em podcast!  A autoria do termo é atribuída a um artigo do jornal britânico, The Guardian, em 12 de fevereiro de 2004. É como um programa de rádio com conteúdo de mídia sob demanda, você pode ouvir o que quiser, na hora que bem entender. Os temas são os mais abrangentes possíveis: cinema, TV, literatura, ciências, profissionais, política, notícias, games, culturais, religiosos, educacionais, humorísticos, musicais, esportivos… E tem muito mais. Haja tempo!

Segundo os divulgadores, o podcast aumenta tua produtividade, te ajuda a crescer e a evoluir. Com a correria de hoje o tempo precisa ser bem administrado, e o conselho é não largar o celular nem os fones de ouvido, quando estiver perdendo tempo no trânsito, viajando, lavando louça, arrumando a casa, ou até mesmo no sanitário.

Pois é, os antigos leitores já estão preferindo ouvir podcasts do que ler o jornal, só o The New York Times possui cadastrados, mais de 2 milhões de ouvintes de podcasts. Antigamente, víamos, no transporte coletivo, jovens lendo romances impressos, ou uma revista, um jornal, hoje, todos estão concentrados nos fones de ouvido, enquanto isso as livrarias e bancas de revistas vão desaparecendo aos poucos do cenário cultural. 

Em número de adeptos, o ouvido vai superar a visão? A leitura vai perder para o arquivo de áudio? Certamente, alguns estudiosos afirmam que a leitura é mais dispersiva do que o áudio, ou seja, você aprende mais ouvindo do que lendo, estilo academias gregas da antiguidade. Os bons professores não mais indicarão livros aos seus alunos, mas podcasts ou palestras gravadas para o Youtube, interagindo visão e audição.

É o prenúncio do império da fala/audição. Tomara que estejamos retornando ao tempo dos grandes improvisadores, como Demóstenes, Cícero, padre Vieira, Rui Barbosa, Almino Afonso e tantos outros. Os textos lidos em voz alta por quem sabe ler, dando ênfase às palavras, é de uma beleza ímpar, a boa declamação de uma poesia paralisa o ouvinte, embora tudo passe pela escrita/leitura. Já há experimentos de autores, que, em vez de escreverem, estão gravando textos, com a ajuda de coadjuvantes, como se estivéssemos voltando ao tempo das novelas de rádio: Jerônimo, o Herói do Sertão! Saudade.

As crianças, logo logo, não mais ouvirão suas mamães lendo um livrinho de histórias infantis, ou cantando canções de ninar, ouvirão podcasts da mamãe em formato babá eletrônica, gravados anteriormente.

Recentemente, em 18 e 19 de novembro próximo passado, ocorreu o I Congresso Internacional de Literatura Minimalista uma promoção da ABLAM -Academia Brasileira de Letras e Artes Minimalistas e não poderia deixar de registrar o magnífico trabalho que o escritor Viriato Moura vem fazendo em Rondônia, escrevendo um livro atrás do outro, com nanocontos, haikais, mini contos, etc. etc. Viriato é um incansável guerreiro da área da escrita e da fabulação curtas, ensinando jovens e adultos a lerem e a pensarem. Pena que não há interesse governamental pelo assunto. Do texto curto ao longo, só depende da vontade e do incentivo, pelo prazer da leitura.  Que tal um podcast reproduzindo a leitura de um nanoconto e o comentário crítico de outros participantes?

Semana que vem vou aproveitar a oportunidade de um encontro com o confrade Viriato Moura e vou sugerir a criação de uma Academia Rondoniense de Letras e Artes Minimalistas – ARLAM nos moldes da ABLAM, quem sabe assim possamos purificar as letras, atraindo jovens e adultos, para o significado da máxima, Menos é Mais!!!  

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