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Montezuma Cruz

TREINAMENTO DA LCP POVOA IMAGINÁRIO DE PMs



Acampamento da LCP em Jacinópolis: suposto treinamento com líderes da Farc povoa o imaginário de PMs


MONTEZUMA CRUZ E CHICO ARAÚJO
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BRASÍLIA – Com base na espionagem de um único agente que fez fotos do grupo a distância, a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) acredita na existência de um movimento guerrilheiro que seria fomentado pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) na região de Buritis e Nova Mamoré, em Rondônia, onde atua a Liga dos Camponeses Pobres (LCP). A entidade admite sua articulação com os movimentos de trabalhadores rurais de Rondônia e do Sul do Pará, dos urbanitários, dos bancários e dos rodoviários em pelo menos três estados, mas nega ligações com a guerrilha sul-americana.

Nesta terça-feira, o deputado Moreira Mendes (PPS-RO) disse na tribuna da Câmara que a Liga "já é considerada pelo governo brasileiro o maior movimento terrorista-revolucionário do País". Mendes pediu a transcrição nos anais da Câmara de reportagem publicada no jornal Folha de Rondônia, no qual consta que o governo federal "há tempo conhece o movimento terrorista da Liga no interior de Rondônia". O jornal é de Ji-Paraná e tem ligação com o governador de Rondônia, Ivo Cassol. A reportagem repete o que publicou no dia 26' de março a revista Istoé.

O deputado respaldou a reportagem, segundo a qual um agente da ABIN, cujo nome obviamente não foi mencionado, viu as operações do grupo. As suspeitas sobre treinamento de guerrilha vêm sendo alardeadas pelo serviço reservado da PM no interior de Rondônia. Daí para os ouvidos dos parlamentares foi um pulo.

Segundo o jornal e a revista, "pelas técnicas usadas, tudo indica que os militantes da LCP receberiam treinamento de guerrilha dos dois maiores grupos de ação da América do Sul, que são as Forças Revolucionárias da Colômbia (Farc) e Sendero Luminoso do Peru". De acordo com a Folha, a LCP teria cerca de dois mil guerrilheiros e "um grande número de membros em outras funções". Atribui-se ao movimento a morte de "mais de 100 pessoas, entre civis, camponeses, militares, e até mesmo de militantes que se recusam em continuar com o movimento terrorista". Espantoso é que não se menciona um só nome das supostas vítimas da LCP.

Armas

Recentemente, a ABIN teria descoberto um acampamento em Jacinópolis, a 400 quilômetros de Porto Velho, onde haveria fuzis, metralhadoras e até granadas. "O acesso ao acampamento é feito somente por uma balsa", diz a reportagem. "Fotos tiradas com uma máquina escondida revelam a preparação de treinamento paramilitar de homens, mulheres e crianças", afirma o jornal. No entanto, suas suspeitas não vão além das fotos tiradas a distância.

Boatos dando da presença de guerrilheiros em Rondônia – pelo menos os do Sendero – são antigos. Quando senador, Mendes ouvira as mesmas histórias sobre a presença de "senderistas" em Rondônia. Até meados dos anos 2000 a Polícia Federal não confirmara essa versão. Agora, por conta da revista e do jornal de Ji-Paraná, suspeita-se também das Farc. Mas o Governo de Rondônia não apresenta provas convincentes.

Mendes afirmou que no interior de Rondônia, a LCP estaria impedindo ações do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e da própria PF. Diz a matéria do jornal citado pelo deputado que o movimento camponês ameaça e mata agricultores que estariam se recusando a pagar taxas aos seus militantes. Acusam os camponeses pelo desmatamento, no entanto, deixam de mencionar quantos metros cúbicos teriam derrubado e em que período.

Tráfico

O jornal levanta ainda suspeita do tráfico de drogas envolvendo pessoas da LCP. Ouvidos pela Agência Amazônia, militantes do movimento refutam, devolvendo a suspeita: "Quem sabe, se a PF investigar bem, irá constatar até pistas de pouso clandestinas na região onde assassinaram um dos nossos companheiros;com certeza, não fomos nós quem as construímos", disse um deles. Os camponeses confirmam, sim, a construção da ponte de madeira em Jacinópolis.

Ainda segundo a Folha, "um dos instrutores, com sotaque estrangeiro, sempre dizia que era preciso ter tiro fijo (tiro certeiro). Tiro fijo também seria o apelido de um dos chefes das FARC, o colombiano Manuel Marulanda Vélez. Uma vez mais, o agente que disse ter conseguido fotografar a distância não explicou como conseguiu ouvir conversas do suposto treinamento.

Amorim culpa o governo

O deputado Ernandes Amorim (PTB-RO) também acusou hoje a LCP de promover terrorismo rural. Ele se queixa da "desobediência civil, da falta de governo, das atividades econômicas na região, que se encontram verdadeiramente desorganizadas". Ele culpa o movimento pela situação: "Uma frente de pessoas armadas ameaça, mata, invade, rouba, faz o que bem entende no Estado, e nós não sabemos a quem pedir socorro. As autoridades sabem o que está ocorrendo em Rondônia, porém não tomam nenhuma atitude. O Exército tem conhecimento, bem como o Governo Federal".

Para Amorim, existe uma "proliferação de organizações anárquicas na Amazônia, associada aos altos índices registrados no norte do Mato Grosso, Rondônia, e sul do Pará". Isso, conforme relatou, "resulta da omissão histórica do governo federal na regularização das atividades econômicas que dependem da utilização de recursos naturais controlados pela União: extração mineral, extração madeireira, e atividades agropecuárias em áreas pendentes de regularização fundiária e regularização ambiental das propriedades rurais"

O deputado alerta que a solução dos problemas de Rondônia não será obtida "com operações policiais que combatem trabalhadores e não os bandoleiros iguais aos dessa organização criminosa denominada Liga dos Camponeses Pobres". Para Amorim, se o Estado é omisso, "negando a regularização e criminalizando as atividades produtivas que demandam a utilização de recursos naturais conforme a tradição cultural da população, o resultado é a legitimação da violência para prevalecer a própria razão". 

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Única ponte de madeira foi construída por camponeses, conforme eles próprios relatam no site do movimento


Para a LCP, ataques repetem Corumbiara

BRASÍLIA – Mencionada na reportagem como "grupo armado", "organização guerrilheira", "responsável por homicídios e desmatamento ilegal", a LCP afirmou em nota que não se surpreende: "Pouco antes do chamado Massacre de Corumbiara, em 1995, a grande imprensa de Rondônia também acusava os camponeses que ocuparam a Fazenda Santa Elina de fazerem treinamento de guerrilha, e o resultado todos sabem qual foi: homens, mulheres e até crianças assassinadas pela polícia e pelos jagunços da fazenda. É esse o motivo da matéria da Istoé, reproduzida aqui em Rondônia pelo jornal dos latifundiários, Folha de Rondônia. Ou seja, preparar o clima para um massacre em Jacinópolis, sonho desses latifundiários". 

A revista publicou as acusações baseada em declarações do delegado de Buritis, Iramar Gonçalves, do fazendeiro em União Bandeirantes, Sebastião Conti Neto, de membros da Polícia Militar Ambiental e do ex comandante da PM em Jaru, major Enedy Dias.

"Ódio de classe"

Para a direção da LCP, a imprensa vem estampando "ódio de classe" ao acusá-la de "trupe maltrapilha, encapuzada e arredia". Considera que isso é uma tentativa de criminalizar os camponeses. Exemplifica: "Algum tempo atrás, Wenderson Francisco dos Santos, o Ruço, e Edilberto Resende da Silva, o Caco foram injustamente acusados pela morte de um pistoleiro do latifundiário e grileiro Galo Velho, um dos maiores do ramo da grilagem no País, reconhecido no Livro Negro da Grilagem de Terras do Governo Federal". 

A LCP lembra que há um ano o Tribunal do Júri julgou Ruço inocente em Jaru, na BR-364 (rodovia Cuiabá-Porto Velho). "Ele foi torturado na prisão, onde permaneceu por quatro anos. (...) O povo soberanamente decidiu, mas o latifúndio continua a insistir em criminalizá-lo por ele ser "membro da Liga".

Fonte: Montezuma Cruz - Agênciaamazônia é parceira do Gentedeopinião

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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