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Hiram Reis e Silva

Sítio de Bagé - Parte VI - Escape a ruins Sicários Constantino, Venha a meu lado, e soará no Mundo


 Republicanos, comandados pelo Coronel Carlos Maria da Silva Telles - Gente de Opinião
Republicanos, comandados pelo Coronel Carlos Maria da Silva Telles

Bagé, 03.04.2020
 

Escape a ruins Sicários Constantino,
Venha a meu lado, e soará no Mundo,
Que, se a assaltar-me vem, é dos bons Príncipes
Inexpugnável muro, o amor dos povos.
(Os Mártires ‒ François-René de Chateaubriand)

 

 

A Federação n° 42

Porto Alegre, RS ‒ Segunda, 19.02.1894

 

História do Sítio de Bagé

Fatos e Documentos

 

 

Mas antes disso, no dia 3, os Srs. Cacildo Carrion, Antonio Nunes R. Magalhães, Henrique Fonyat e Antonio Vale, encarregados dos consulados da República Oriental, Portugal, Itália e Espanha, dirigiram ao Coronel Telles um pedido de concessão para que se retirassem da cidade, ameaçada do sítio, as famílias dos seus súditos, sendo-lhes recusado o que pediam e do que lavrou-se a presente ata:

 

 

 

Aos 3 dias do mês de dezembro de 1893, às duas horas da tarde, na chancelaria do Cônsul da República Oriental do Uruguai, à rua 3 de fevereiro n° 36, na cidade de Bagé, Estado do Rio Grande do Sul, reunidos os abaixo-assinados:

 

Tenente-coronel Cassildo Carrion, Cônsul da República do Estado Oriental do Uruguai;

Antônio Nunes Ribeiro Magalhães, Vice-cônsul de Portugal;

Henrique Fonyat, Régio Agente Consular da Itália;

Antonio Vale, encarregado do vice-consulado da Espanha.

 

Em virtude de encontrar-se a cidade de Bagé, sitiada por Forças Revolucionárias e prestes a ser atacada à viva força, segundo é voz pública, os abaixo assinados, representando seus respectivos súditos, deliberaram dirigir-se ao cidadão Coronel Carlos Maria da Silva Telles, comandante da guarnição, pedindo-lhe o seu consentimento para que, antes do ataque, se retirassem da cidade as famílias de seus súditos, que assim quisessem proceder, o que efetivamente realizaram apresentando-se pessoalmente ao referido cidadão Coronel Carlos Maria da Silva Telles, e manifestando-lhe o motivo que os levava à sua presença.

 

Ouvidas pelo cidadão Coronel Carlos Maria da Silva Telles as razões expostas pelo Tenente-coronel Cassildo Carrion, Cônsul Oriental, foi pelo mesmo cidadão Coronel Carlos Maria da Silva Telles respondido: que não dava licença que família alguma se retirasse da cidade, com exceção das dos abaixo assinados que poderiam retirar-se quando julgassem conveniente, o que agradeceram.

 

Em vista da contestação do cidadão Coronel Carlos Maria da Silva Telles, os abaixo-assinados retiraram-se e protestando, em nome de seus referidos governos, pelos danos o prejuízos que possam sofrer seus súditos, tanto em suas vidas como em seus interesses, no caso de ataque à cidade e bombardeio, resolveram também comunicar aos seus respectivos superiores todo o ocorrido, lavrando-se em seguida a presente ata, que fica assinada, timbrada e arquivada na chancelaria do Consulado Oriental do Uruguai e da qual foram extraídas quatro cópias, enviando-se uma ao cidadão Coronel Carlos Maria da Silva Telles, comandante da guarnição, acompanhada de ofício assinado pelo Tenente-coronel Cassildo Carrion, cônsul da República do Estado Oriental do Uruguai, como decano do corpo consular desta cidade, e uma a cada uma das chancelarias dos signatários.

 

Chancelaria da República Oriental do Uruguai, na cidade de Bagé, 3 de dezembro de 1893. [Assinado] Cassildo Carrion, Cônsul Oriental; Antonio Nunes Ribeiro Magalhães, vice-cônsul de Portugal; Henrique Fonyat, régio agente consular de Itália; Antonio Vale, encarregado do vice-consulado de Espanha.

 

Está conforme o original ao qual me reporto.

 

[Assinado] Cassildo Carrion, Cônsul Oriental.

 

Confere. Octavio Carlos Pinto, Capitão.

 

 

 

Este protesto foi enviado com o seguinte ofício explicativo ao Ministro e Secretário das Relações Exteriores:

 

 

 

Comando da Guarnição e Fronteira de Bagé, 4 de dezembro de. 1893.

 

Ao cidadão Ministro e Secretário das Relações Exteriores.

 

Remetendo-vos incluso o protesto que me foi dirigido pelo corpo consular aqui residente, cumpre-me informar-vos dos motivos que me levaram a não permitir a retirada dos súditos estrangeiros e suas famílias desta cidade, que se acha sitiada por numerosas forças revolucionárias compostas em grande parte de bandidos e estrangeiros mercenários que não respeitam a honra das famílias, a propriedade e a vida de ninguém, o que ficou ainda bem patente nos últimos combates travados no Rio Negro, onde procederam a grande degolação em centenas de prisioneiros já rendidos, seguido de desbragado saque, sendo que aos mesmos rendidos o fizeram apesar de terem estes entregado as armas com a promessa e confiantes na palavra de honra dos chefes revolucionários, que garantiam suas vidas e até mesmo a liberdade com a condição de não se envolverem mais em revolução em prol do governo.

 

Estando como estão não só aqueles estrangeiros, suas famílias, como toda a população respeitados, com todas as garantias nesta cidade, e ainda mais sob a proteção de forte e moralizada guarnição militar sob o meu comando, entendi que me ocorria o dever de não permitir que se expusessem essas famílias a desonra e ao saque dos bandidos revolucionários, que continuam sitiando a cidade, declarando e manifestando grande ganância ao desenfreado saque e sanha de toda a ordem.

 

Saúde e fraternidade.

 

Carlos Maria da Silva Telles, coronel.

 

 

 

No dia 9 de dezembro chegou da Charqueada um próprio trazendo a seguinte carta ao Coronel Telles, escrita pelo médico Carlos Laudares, Major cirurgião do Exército Libertador, em papel timbrado com o símbolo da Cruz Vermelha e com os seguintes dizeres:

 

 

 

Corpo de Saúde

 

[o símbolo e por baixo]

 

Comissão de socorros aos feridos na guerra do Rio Grande:

 

Exm° Sr. Coronel Carlos da Silva Telles, comandante da guarnição.

 

Existindo entre os feridos em tratamento na ambulância 30 quase completamente nus, peço a V. Sª se digne consentir, que dessa praça me sejam remetidos pelo Sr. Magalhães 30 mudas de roupa, conforme o pedido que junto e que peço o obséquio de mandar entregar.

 

A ambulância tem atualmente 81 feridos, dos quais 25 pertencentes às Forças Revolucionárias e 56 das Forças Governistas e todos seguem bem. Sou de V. Sª criado e obrigado.

 

Carlos Laudares, cirurgião chefe da cruz vermelha.

 

 

 

O Coronel Telles respondeu pela forma seguinte:

 

 

 

Ilm° Sr. Dr. Carlos Laudares.

 

Bagé de 10 dezembro de 1893.

 

Recebi sua carta e sinto bastante não poder consentir na saída das roupas que mandou pedir ao Sr. Magalhães. Quem não pode com o tempo não inventa moda. Se não tem vestuários e o mais de que carecem os feridos, mande-os para cá que nada lhes faltará. Não sei nem quero saber o que quer dizer cruz vermelha e com certeza os feridos pertencentes às forças do governo, dela não precisam.

 

A minha condescendência e generosidade não vão ao ponto de mandar roupa para o inimigo. Os feridos a que acima me refiro estavam perfeitamente vestidos e se não foram saqueados devem assim ainda estar.

 

Sou como sempre criado e obrigado

 

Carlos Telles.

 

 

 

No dia 9 de dezembro, o Coronel Carlos Telles mandou imprimir e distribuir por toda a parte o seguinte aviso:

 

 

 

Comando da Guarnição e Fronteira de Bagé.

 

Por este Comando se declara que é permitido a todas as famílias moradoras nesta cidade, quer brasileiras, quer estrangeiras, retirarem-se para onde lhes aprouver, devendo antes de o fazer comparecer ao Quartel do Comando da Guarnição, a fim de serem acompanhadas por oficiais de serviço até fora dos piquetes.

 

Bagé, 9 de dezembro de 1893.

 

Carlos Telles, Coronel.

 

 

 

Nesse mesmo dia, seriam 4 horas e 1/4 da noite rompeu de todos os pontos da cidade onde se haviam entrincheirado os maragatos um tiroteio vivíssimo contra a praça, cujos defensores correram imediatamente a postos, soltando vivas e desafios com indescritível entusiasmo.

 

Todos unanimes, persuadiam-se que era chegado o tão almejado momento da luta decisiva e preparavam-se para infligir aos bandidos a mais severa e eficaz das lições.

 

Nessa noite iniciaram o seu sistema de depredações, saqueando completamente as casas dos Srs. Francisco Torres & Ciª, negociantes estrangeiros, situada no extremo da cidade em frente ao velho quartel do 5° Regimento.

 

As portas foram arrombadas a machado e o prejuízo elevou-se a mais de 40 contos.

 

Mas o inimigo conhecendo as vantagens de nossa posição e a firmeza de nossa atitude preferiu conservar-se prudentemente à distância, e limitou-se a tirotear-nos de longe todas as noites.

 

Quando o fogo era demasiado vivo, alguns disparos de artilharia para os pontos mais impertinentes lhes moderavam o entusiasmo e desalojavam de suas posições.

 

Assim passaram os dias, em troca de balas de lado a lado, apesar de serem parcos em tiros os nossos soldados, por ordem do Coronel Telles, até que no dia 15 pela manhã, havendo na praça falta de gado e costumando os inimigos trazer rezes, como que para chamariz para as faldas do cerro, resolveu o Coronel Telles arrebatar-lhes a isca que nos mostravam. Duas Companhias do 2° Batalhão da Brigada Militar, sob o comando do calmo e destemido Major Alfonso Massot, estenderam linha além do cemitério, ao mesmo tempo que um piquete de cavalaria carregava impetuosamente, apoderando-se de oito gordos bois, que os maragatos tiveram que abandonar, bem contra a sua vontade.

 

Foi para a praça um dia de festas, pois, há muito que não se comia carne fresca.

 

Nesse mesmo dia, à tarde, animados pelo sucesso que haviam obtido de manhã, foram 40 praças do 31°, comandadas pelos Alferes Paes Leme e Álvaro Lima, indo também nele, como curioso, o bravo Capitão Corrêa, 6 homens de cavalaria sob o comando do Capitão Rodolpho dos Santos e todos dirigidos habilmente pelo Tenente Marcos Telles, dirigiram-se para a chácara do Dr. Vinhas, onde se achava entrincheirado e fazendo contínuo fogo um piquete de 40 e tantos inimigos.

 

Não puderem resistir à violência e inesperado do ataque, deixando 3 homens mortos e fugindo todos os outros na mais desenfreada disparada, seminus e sem poderem transportar coisa alguma.

 

Nessa expedição foram tomadas 15 lanças, 40 e tantos pares de arreios, armas de fogo, munição, roupas, laços e toda a cavalhada do piquete.

 

Durante muitos dias não se atreveram a voltar e ocupar aquela posição.

 

Passados cinco dias, para que tomassem fôlego, organizou-se outra expedição que foi operar na Boa Vista. 29 homens de cavalaria, armados unicamente de lança e sob o comando do valente Major Cândido Bueno, fizeram uma brilhante carga sobre um piquete de 11 maragatos, dos quais 6 ficaram mortos, escapando-se os 5 restantes.

 

Dos nossos ficaram levemente feridos o Major Bueno, o comandante da guarda aduaneira João Vieira do Amaral Charão e o Soldado de nome Leopoldo.

 

Finalmente, na noite de 22 de dezembro foi que os inimigos da Pátria e da República iniciaram seriamente o ataque há muito tempo premeditado sobre a bela e futurosa cidade de Bagé.

 

Depois de encarniçado combate sustentado com toda a galhardia pelo piquete que se achava no mercado público comandado pelo Capitão Frederico Jardim, os inimigos apoderaram-se daquele edifício, onde prorromperam em gritos e insultos contra vários membros do Partido Republicano.

 

O piquete retirou-se para a praça em boa ordem, tendo perdido 14 homens, uns feridos e outros prisioneiros, que no dia seguinte foram degolados e dois queimados vivos, entre os quais o Sargento Tibúrcio da Rosa, tendo sido também numerosas as perdas do inimigo.

 

Às 11 horas e um quarto rompeu vivíssimo fogo para o interior da praça, onde, no cumprimento de seu dever, se havia entrincheirado a sua heroica guarnição, nobremente disposta a vencer ou sucumbir, defendendo o governo legítimo contra o qual investem perversamente os sanguinários empreiteiros do 3° Reinado, aliados aos falsos apóstolos da ideia republicana. [Continua] (A FEDERAÇÃO N° 42)

 

 

 

 

Bibliografia:

 

A FEDERAÇÃO N° 42. História do Sítio de Bagé ‒ Brasil ‒ Porto Alegre, RS ‒ A Federação n° 42, 19.02.1894.

 

Solicito Publicação

 

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;

 

·    Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)

·    Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);

·    Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);

·    Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);

·    Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)

·    Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);

·    Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);

·    Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);

·    Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)

·    Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);

·    Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)

·    Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).

·    Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).

·     E-mail: [email protected].

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