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Hiram Reis e Silva

O Rei dos Rios – Parte I


O Rei dos Rios – Parte I - Gente de Opinião

Bagé, 02.07.2020

 

Rio das Amazonas

 

O Amazonas é um extraordinário manancial que vem desafiando, através dos últimos cinco séculos, não apenas a capacidade dos cientistas de determinar suas características fisiogeográficas e a pródiga imaginação dos românticos poetas mas, sobretudo, a capacidade de sobrevivência sustentável dos povos da floresta cujas vidas dependem diretamente de suas águas.

 

Águas alegres e generosas que fertilizam a várzea e estimulam os ribeirinhos a acorrerem em mutirões lançando, na vazante, suas sementes às praias fecundas, para colher mais tarde os frutos de seu esforço e da munificência do pródigo caudal.

 

Águas por vezes procelosas, soturnas, fúnebres mesmo, arrancando enormes barrancos das margens arrastando árvores, casas e levando o terror às almas destemidas dos povos das águas.

 

O Rio, que no passado corria para o Pacífico, que mais tarde foi transformado em um imenso Lago (Pebas) continua moldando, trabalhando as margens a seu bel-prazer. Arrancando um barranco aqui, iniciando uma Ilha mais adiante, assoreando e abandonando um Canal acolá, transformando um pequeno Furo em braço principal e levando por diante uma Ilha mais além, é a “Inconstância Tumultuária” a que se refere o inigualável Euclides da Cunha, no seu “Paraíso Perdido”.

 

Amazônia, a Pátria da Água

 

O artífice das letras Thiago de Mello faz um belo relato poético-geográfico do grande Rio sob o título “Nasce o Amazonas”. O texto do grande mestre nos faz sonhar! Vagamos juntos desde a cordilheira majestosa, onde o pequeno filete d’água brota das perenes geleiras moldando seu curso, ainda infantil, na parede das rochas, e ganha, pouco a pouco, energia de outras fontes andinas até penetrar na luxuriante vereda tropical cujo traçado instável e indeciso segue a cavaleiro da linha do Equador até alcançar o mar através de seu formidável estuário.

 

Da altura extrema da cordilheira, onde as neves são eternas, a água se desprende e traça um risco trêmulo na pele antiga da pedra: o Amazonas acaba de nascer. A cada instante ele nasce. Descende devagar, sinuosa luz, para crescer no chão. Varando verdes, inventa seu caminho e se acrescenta. Águas subterrâneas afloram para abraçar-se com a água que desceu dos Andes. Do bojo das nuvens alvíssimas, tangidas pelo vento, desce a água celeste. Reunidas, elas avançam, multiplicadas em infinitos caminhos, banhando a imensa planície cortada pela linha do Equador.

 

Planície que ocupa a vigésima parte da superfície deste lugar chamado Terra, onde moramos. Verde Universo equatorial, que abrange nove países da América Latina e ocupa quase a metade do chão brasileiro. Aqui está a maior reserva mundial de água doce, ramificado em milhares de caminhos de água, mágico labirinto que de si mesmo se recria incessante, atravessando milhões de quilômetros quadrados de território verde... É a Amazônia, a pátria da água. (MELLO)

 

À Margem do Amazonas

 

O escritor Aurélio Pinheiro, o maior romancista do Rio Grande do Norte, lançou seu primeiro romance, “O Desterro de Umberto Saraiva”, em 1926, editado na livraria Clássica, de Manaus e, em 1937, pela Companhia Editora Nacional, o “A Margem do Amazonas”. Reproduziremos um trecho desta histórica obra:

 

Ao chegar ao Haiti, Colombo quer ver o lugar das minas, porém os indígenas informam ao navegador que essa terra ficava ao Oriente. Colombo arriba, inquieto, desistindo da aventura.
(Joachim Heinrich Campe)

 

Havia um país atravessado por um Mar Branco, cujas vagas arrastavam areias de ouro e pedras diamantinas. A capital desse país, Manôa, [nome semelhante ao da tribo Manao ou Manôa, que vivia no solo onde foi fundada Manaus, capital do Estado do Amazonas] era uma grande Cidade, com muitos palácios, alguns construídos com pedras marchetadas de prata; outros possuíam telhados de ouro. No solo viam-se metais preciosos. Manôa continha todas as riquezas da terra; e lá reinava um homem que se chamava El Dorado, porque tinha no corpo reflexos de ouro, tal como o céu pontilhado de estrelas. (Barão de Santa-Anna Nery)

 

Nesse tom de fantasia, de deslumbramento, de miragens alucinantes, se vai desdobrando toda a história do descobrimento da América, e pouco a pouco a lenda do El Dorado cresce desordenadamente na imaginação dos conquistadores. O primeiro homem que percorreu todo esse Mar Branco [à parte a viagem pela sua Foz contada por Vincente Pinzón, em janeiro de 1500, e a imprecisa digressão de Diogo de Leppe por todo o litoral do Brasil] Francisco de Orellana, Lugar-Tenente de Gonçalo Pizarro, depois valido ([1]) de Carlos V, afinal Governador Geral dessa região que se chamou Nova Andaluzia, por pertencer ao Reino da Espanha – muito sofreu antes de alcançar o País da Canela e o El Dorado, que pretendia desvendar ao mundo.

 

Dois anos e oito meses durou a infeliz aventura. E desde o vale de Zamaco, quando se reuniu a Gonçalo Pizarro, até onde o Amazonas se despeja no Atlântico, a sua caravana padeceu, como talvez nenhuma outra na terra, os revezes mais rudes, atormentada pelas moléstias, assaltada pelos silvícolas, esfomeada, destroçada, em farrapos, varando florestas e Rios.

 

E só quatro séculos depois, a História começou a fazer justiça a esse desgraçado aventureiro, que não foi um traidor, que sacrificou toda a fortuna nessa jornada célebre, e que veio, afinal, a morrer miseravelmente perdido entre as Ilhas do Amazonas. Sobre esse temerário empreendimento os anos passam silenciosos; e só mais tarde, Lopo de Aguirre, a mais sinistra revelação da maldade humana, penetrou no Mar Branco em busca do país dos Omáguas, do El Dorado, depois de ter deixado nos barrancos do Solimões os cadáveres de Pedro Ursúa e seus companheiros, assassinados por ordem sua na noite trágica de 01.01.1561.

 

Perdem-se, desde essa época, os traços de novos exploradores do grande Rio. Talvez porque os sacrifícios dessas explorações fossem além de toda expectativa; talvez por causa do desencantamento dos primeiros navegadores, que não chegaram a ver a famosa Manôa dos palácios de ouro e dos monumentos incrustados de pedras preciosas; talvez porque a Espanha se desinteressasse – apesar do Tratado de Tordesilhas – dessa Nova Andaluzia absurdamente grandiosa, que devorava tantas vidas – verdade é que não há notícias de outras expedições durante o domínio espanhol na Amazônia.

 

E ficou ao abandono, por muito tempo, a região feiticeira, notável até então apenas pelo furor guerreiro das Icamiabas que atacaram Francisco de Orellana na Foz histórica do Nhamundá, espalhando o terror e criando uma lenda maravilhosa. [...] (PINHEIRO)

 

Bibliografia:

 

MELLO, Thiago de. Amazonas, Pátria da Água – Brasil – Rio de Janeiro, RJ – Editora Bertrand, 2008.

 

PINHEIRO, Aurélio. À Margem do Amazonas – Brasil – São Paulo, SP – Editora Companhia Nacional, 1937.

 

Solicito Publicação

 

(*) Hiram Reis e Silva é Canoeiro, Coronel de Engenharia, Analista de Sistemas, Professor, Palestrante, Historiador, Escritor e Colunista;

 

·    Campeão do II Circuito de Canoagem do Mato Grosso do Sul (1989)

·    Ex-Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA);

·    Ex-Pesquisador do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx);

·    Ex-Presidente do Instituto dos Docentes do Magistério Militar – RS (IDMM – RS);

·    Ex-Membro do 4° Grupamento de Engenharia do Comando Militar do Sul (CMS)

·    Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS);

·    Membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil – RS (AHIMTB – RS);

·    Membro do Instituto de História e Tradições do Rio Grande do Sul (IHTRGS – RS);

·    Membro da Academia de Letras do Estado de Rondônia (ACLER – RO)

·    Membro da Academia Vilhenense de Letras (AVL – RO);

·    Comendador da Academia Maçônica de Letras do Rio Grande do Sul (AMLERS)

·    Colaborador Emérito da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG).

·    Colaborador Emérito da Liga de Defesa Nacional (LDN).

·    E-mail: [email protected].



[1]   Valido: protegido.

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