Porto Velho (RO) quinta-feira, 28 de março de 2024
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Gente de Opinião

Dom Moacyr

Os ateus e a violência


Segundo Dom Moacir, Rondônia tem a segunda maior população de ateus do país 


Num depoimento de várias horas ao jornal eletrônico gentedeopinão e a revista Momento Brasil, o arcebispo de Porto Velho Dom Moacir Grechi, a voz dos oprimidos, discorre sobre sua trajetória na Amazônia e se posiciona sobre temas importantes como a construção das hidrelétricas do Madeira, o avanço dos evangélicos, a vocação sacerdotal, sua passagem pelo Acre, a pobreza, a violência e, não esconde sua preferência: para ele o atual presidente Lula é o melhor de todos que ele acompanhou até agora.  Nascido na pequena cidade de Turvo, Grechi fez noviciado em São Paulo.  Estudou Teologia em Roma onde foi ordenado padre. Foi eleito Bispo, porque o seu antecessor morreu em um desastre aéreo – “ele morreu novinho, com 43 anos” – e Grecchi assumiu ainda com 36 anos o cargo em Rio Branco. Ficou 27 anos no estado do Acre, e quando pensava que ia ser enterrado lá, “já tinha até o lugarzinho certo”, o Papa o transferiu aqui para Porto Velho. Acompanhe seu depoimento: 

Gentedeopinião - Como foi sua passagem lá no Acre, parece que o senhor marcou uma época lá... 

Dom Moacyr – Bem, num certo momento eu tinha uma mentalidade ainda de sacristia, eu achava que a minha função era pregar o Evangelho, dar os Sacramentos, tentar manter o pessoal unido. Eu não queria entrar nesse aspecto, digamos, política com “P” maiúsculo, isto é, busca do bem comum com da justiça, eu praticamente fui forçado pelo Povo. O povo confiava em mim, então eu fui tendo contato com as injustiças bárbaras, arbítrios de autoridades, e acabei me envolvendo. Também naqueles anos eu fui eleito Presidente Nacional da Comissão Pastoral da Terra. Então a problemática era terra para o Brasil inteiro, e eu fui muito bem assessorado, seja por pessoas competentes, e no Acre por pessoas muito próximas. Aí então diziam que a Igreja do Acre era do PT. Não é. É que todo mundo que trabalhava acabou fundando o PT e ficou muito marcado por esse aspecto.
 
GENTEDEOPINIÃO – O senhor veio para Rondônia e encontrou uma realidade mais ou menos parecida, nós temos aqui problemas diversos na política. O senhor acha que aqui a gente ainda tem futuro?
DOM MOACYR – Futuro tem, porque o povo é maior do que qualquer governo. Agora, no momento, eu tenho a sensação de que nós estamos muito debaixo do executivo, sem querer ofender ninguém, eu tenho a impressão que a Assembléia está fechada com o governador. a Assembléia vota o orçamento do Ministério Público, do Judiciário, e olhe, aqui não vai julgamento de ordem moral, mas o fato concreto é que fica muito perigoso, se pudesse dizer, seria uma faca de três gumes, isso me preocupa. E me parece que o trabalho de conscientização e cidadania, a Igreja não pegou firme como deveria, sem fazer opção partidária, mas dizendo que o voto é coisa séria, não se pode brincar, a gente paga as conseqüências de eleições que prevalece o interesse próprio. Agora, tem futuro tem, mas com o tempo. 

GENTEDEOPINIÃO – Como o sr. vê a campanha da OAB VOTO NÃO TEM PREÇO TEM CONSEQUÊNCIA? 
Os ateus e a violência - Gente de OpiniãoDOM MAOCYR – Não tenha dúvida, eu ainda não conheço o texto, mas em geral a OAB é apartidária e nós também vamos tomar posição. Agora eu tenho a convicção de que se não há um trabalho constante de conscientização, de organização constante, só com slogan - frase tem efeito muito pequeno - , e ainda infelizmente, o dinheiro pesa muito em uma eleição. 

GENTEDEOPINIÃO – Dom Moacyr, nós estamos às vésperas do leilão das Usinas do Rio Madeira, o que o senhor pensa sobre essa questão?
DOM MOACYR – Bem, eu vou dizer a minha opinião, não é a opinião de igreja, porque tem alguns aspectos técnicos nos quais eu não quero entrar porque não sou competente. Se a gente olha nas outras hidrelétricas, os benefícios foram muito prejudiciais à população circundante. Balbina, uma calamidade total, nunca deveria ter sito feita. Em geral os benefícios não ficam com o povo da região. Mais uma vez fizeram um projeto, dizem que não vai prejudicar, mas nunca foi feito um projeto desses num rio das dimensões do Madeira, eu tenho preocupação. 

Os ateus e a violência - Gente de OpiniãoGENTEDEOPINIÃO – Outra medida polêmica adotada pelo governo é o loteamento e aproveitamento da madeira em reservas nacionais...
DOM MOACYR
– Quer dizer, teoricamente, como me explicou a Marina, a lei é boa, tira só uma árvore dentre tantas. Agora eu quero ver é controlar, é isso que me preocupa, o controle. De outra parte é necessário uma medida. Cada vez que eu vou por essas estradas de Cujubim, Machadinho, aos sábados e domingos é uma festa de caminhões saindo com madeiras. As reservas extrativistas perto de Machadinho estão sendo desfalcadas. 

GENTEDEOPINIÃO – O Senhor acabou de falar das suas viagens, como o senhor tem visto a pobreza das pessoas vivendo em Porto Velho e em Rondônia?
DOM MOACYR - Bem, aqui em Porto Velho a pobreza é maior, nas periferias acredito que até certo ponto temos casas inabitáveis, saúde com muitos problemas. Um dia desses eu fui no hospital João Paulo II e estava atopetada a sala. Eu perguntei para um senhor que me conheceu, meu Deus é sempre assim? Ele me respondeu: “Hoje não tem ninguém Dom Moacyr”. Então, pobre realmente tem dificuldades de se tratar. Se vierem pra cá os 65 mil habitantes a mais com a construção das Usinas do Madeira, como é que nós vamos conseguir solucionar? Existem problemas sérios 

GENTEDEOPINIÃO – Mudando agora de assunto, para um tema que o senhor é especialista: Como está a igreja na Amazônia, a Igreja em Rondônia, está faltando padre, tem uma crise de vocação?
DOM MOACYR – Bem, crise de vocação nunca houve na Amazônia, porque ela nunca teve padre. Tirando Belém e Manaus que tinham um certo número de cléricos diocesanos, todas as chamadas prelazias eram servidas por padres estrangeiros, italianos, alemães, franceses, holandeses, belgas, então eram todas servidas por estes padres em número diminuto, e que durante a guerra diminuiu ainda mais. Faz pouco mais de 30 anos que nós começamos um trabalho então de formação, e tinha um único seminário para toda nossa Amazônia, que tem três milhões de quilômetros quadrados e tinha só um seminário em Manaus. Como é que eu ia mandar de barco pessoas para estudar em Manaus em um seminário precário?. Então até 30 anos atrás Dom João não ordenou nenhum padre.. Agora nesses últimos 30/35 anos, houve um trabalho de promoção vocacional, os padres ainda são muito poucos, mas desde que estou aqui já devo ter ordenado mais de dez.

GENTEDEOPINIÃO – Como o senhor vê o avanço dos evangélicos nos estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo e Rondônia?
DOM MOACYR
– As igrejas eletrônicas não tem comunidade, tem fregueses. Agora tem um estudo, uma tese de um escritor do Rio de Janeiro que mostrou recentemente que a Igreja, numericamente, nunca foi tão grande como agora. Agora no Rio de Janeiro e Espírito Santo eu creio, como dizia o Evangelho, “eu não abandonei a Igreja, foi a Igreja que me abandonou”, a igreja não teve flexibilidade de atender. Veja Rondônia, há 30 anos tinha oitenta mil habitantes, hoje tem 1.400.000 e o número de padres não aumentou tanto assim, proporcionalmente, então fica uma população religiosa a mercê de quem chegar. Eu conheço famílias católicas apostólica romana que freqüenta regularmente a Assembléia de Deus, aí eu pergunto você é da Assembléia, não, mas os padres não vão lá, não tem missa, e eu vou na Assembléia de Deus para escutar o Evangelho, e tem um amor muito grande a Nossa Senhora.. Também um grande sociólogo do estado de São Paulo, José Martin, disse que o governo naquele período migratório selecionou as pessoas que vinham para cá, só 20% podia ser católico, pois incomodavam, criavam sindicato, associações. Já os evangélicos eram mais acomodados. Então se explica a falta de clero, com a super-população e depois essa política direcionada, além do lugar que tem mais ateu, tem uma população grande aqui em Rondônia, que é a segunda do Brasil. 

GENTEDEOPINIÃO – E a Universidade Católica, como amadureceu essa idéia?
DOM MOACYR – Bem, Dom Antônio Possamai, há mais de 20 anos me dizia: ‘Moacyr, nós precisamos de ensino superior católico, para passar os valores, princípios, a dignidade humana, o sentido do bem comum, a prioridade nos pobres, a seriedade da política, nós precisamos de uma escola superior’. Então a finalidade é essa, trazer o humanismo cristão para nossos futuros dirigentes e a inclusão social. 

GENTEDEOPINIÃO – Dom Moacyr qual sua visão pessoal e da Igreja nas questões que pautam a mídia - hoje de forma até desencontrada -, droga, família, aborto, homossexualismo?
DOM MOACYRFamília: O Papa João Paulo II dizia que o futuro passa pela família, então eu acho que mesmo a família imperfeita é um dom de Deus, e se muita gente não morre aleijado, deficiente, e velha, é porque ainda restam muitas famílias estruturadas e mesmo aquelas que ainda não são tão estruturas ainda são a única salvação 

O ABORTO – A igreja desde o começo sempre considerou o aborto um crime. Agora temos que levar em conta, uma coisa é o aborto feito por uma pessoa livre e o aborto apavorada, diante do pai, com medo de morrer. Então, do ponto de vista do julgamento em si, a igreja considera um pecado muito grave. Agora no caso de julgar uma pessoa temos que ter extrema misericórdia e compreensão em examinar caso a caso. 

HOMOSSEXUALISMO – Do ponto de vista da bíblia, objetivamente, eu não julgo a pessoa, o homossexualismo é condenado veementemente pela bíblia, agora o homossexual nós temos que ver caso a caso. A igreja considera pecado. 

GENTEDEOPINIAO – Há algum tempo atrás o senhor participou da CPI da terra com dois depoimentos. Houve redução de violência no campo?
DOM MOACYR
– Parece que em questão de violência houve um crescimento, só que hoje você pode falar tudo, hoje você pode denunciar, fazer uma passeata. No tempo da CPI, você tinha que arriscar um pouco a pele, um dos meus depoimentos durou quatro horas e os jornais publicaram tudo. 

GENTEDEOPINIÃO – Como o sr. vê essa violência toda em Rondônia?
DOM MOACYR
– Bom, primeiro nós não temos um sistema prisional adequado. Eu não vejo que Rondônia seja mais violento que o Acre, Amazonas. O certo é que a pobreza e a droga podem afetar, porque a droga faz ganhar dinheiro rápido. A droga é uma tentação e então se mata com facilidade. A pobreza, a falta de emprego, falta de escola, a família desestruturada eu creio que tudo isso pesa também, mas eu não tenho uma resposta mais completa. 

GENTEDEOPINIÃO – O Presidente Lula decepcionou o Senhor, o Os ateus e a violência - Gente de OpiniãoLula para Amazônia era o que o senhor esperava?
DOM MOACYR
– Bom, eu nunca esperei milagre, agora eu sou suspeito, eu sou muito amigo do Lula, desde os tempos antigos. Antes de ser Presidente, nunca pedi nem um favor, mas eu acho que entre os presidentes que nós tivemos é o melhor, pelo menos podemos falar com ele, ele recebe. Falam do Programa Bolsa Família, que é paternalismo, é dependência etc., acaba com a organização popular. Quando é rico ninguém fala que é paternalismo, os filhos dos deputados e dos ricos vão estudar em SP, RJ, com dinheiro do povo e ninguém diz que é dinheiro do povo, ninguém diz que é paternalismo, agora quando se dá um Bolsa Família é paternalismo. Tem risco, tem, mas é melhor do que passar fome. Então eu acho que o governo Lula ainda é o melhor dos que eu conheci. 

GENTEDEOPINIÃO – Para encerrar, qual a sua mensagem de Natal para o povo de Porto Velho e de Rondônia 
DOM MOACYR - No Natal eu aceito que tenha festa mas, meu Deus do Céu, não percamos o central, que é o Filho de Deus que se fez homem e continua homem, e hoje ressuscitado, nós o encontramos em cada pessoa, pobre ou não pobre, a dignidade de todo homem foi elevada a uma altura divina pelo nascimento de Jesus, sua morte e ressurreição. 

Fonte: Gentedeopinião/Jornalista José Carlos Sá/Chico Lemos

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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