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Dom Moacyr

Como fortalecer a cidadania ativa! - Por Dom Moacyr Grechi


 
Setembro: mês da Bíblia. A Bíblia nas mãos do povo, no Brasil, é o grande gesto de libertação. Para o biblista e assessor nacional do CEBI, Francisco Orofino, significa que o leigo tem em suas mãos aquilo que, segundo o documento “Dei Verbum”, é a fonte primeira da Revelação. E se o leigo tem em suas mãos a fonte primeira da Revelação e a lê a partir da sua própria realidade econômica e sociopolítica, esse leigo está fazendo teologia.

Nas Comunidades Eclesiais da Base se faz a leitura popular da Bíblia, ampliando o espaço de vivência, de crescimento na fé, de partilha e solidariedade.

Ao ler a Bíblia, o povo das Comunidades traz consigo a sua própria história e tem nos olhos os problemas que vem da realidade dura da sua vida. A Bíblia aparece como um espelho, símbolo (Hb 9,9;11,19), daquilo que ele mesmo vive hoje. Estabelece-se, assim, uma ligação profunda entre Bíblia e vida que, às vezes, pode dar a impressão aparente de um concordismo superficial. Na realidade, é uma leitura de fé muito semelhante à leitura que faziam as comunidades dos primeiros cristãos (At 1,16-20;2,29-35;4,24-31) e os Santos Padres nos primeiros séculos das igrejas (C.Mesters/F.Orofino/CEBI).

Nos Grupos de Reflexão, Círculos Bíblicos, Comunidades Eclesiais, a leitura bíblica que busca estar a serviço da vida, sempre será libertadora e ecumênica; fortalecerá as organizações e os movimentos populares nas suas lutas, vitórias e conquistas, e também nas suas derrotas.

Aqui no Brasil, as comunidades, animadas pela leitura popular da Bíblia, conseguiram muitos avanços e conquistas na etapa constituinte entre 1986 e 1988, citam os biblistas do CEBI e acrescentam: muitas de nossas propostas se fizeram presentes no texto da Constituição. Mas a mobilização também teve derrotas, como a questão da reforma agrária. O mesmo vale para o plebiscito da Dívida ou a luta contra as privatizações. Muita mobilização para poucos resultados. A lei da Ficha Limpa foi uma grande vitória, mas o referendo do desarmamento foi uma derrota.

Importa que a leitura bíblica anime as comunidades na sua caminhada, sabendo que na vida sempre vamos ter momentos de risos e momentos de choro. O que não podemos como diz o apóstolo Paulo aos tessalonicenses, é “extinguir o Espírito”.

O grande inspirador deste mês da Bíblia é o profeta Miquéias, cujo livro a Igreja propõe para a reflexão das Comunidades, dos Grupos e Círculos Bíblicos por ser o profeta do povo que defende a família, a moradia, a terra.

No Livro de Miqueias, pela boca de um homem da área rural, o grito contra as injustiças sociais. Um profeta que fala em nome de Deus e denuncia uma situação mais perversa do que a própria guerra em andamento: as injustiças sociais, onde ele vê a causa principal da ira de Deus (séc. VIII a.C).

Ao se defrontar com os ricos e dirigentes políticos e religiosos, acusa-os de roubar casas e campos para se tornarem latifundiários e os condena por mandar matar até mulheres e crianças para se apoderarem das terras. Com o poder nas mãos, eles dançam ao ritmo do dinheiro, falseando o peso das mercadorias. Miquéias mostra que a riqueza deles se baseia na miséria de muitos e tem como alicerce a carne e o sangue do povo.

Eles, porém, insistem, com a Bíblia na mão, em provar que são justos e que Deus está com eles; procuram combinar religião com opressão aos fracos. Miquéias denuncia tal perversão como atitude idolátrica; por isso, é taxativo: eles, juntamente com a luxuosa capital e o próprio Templo, serão destruídos.

O livro de Miquéias oferece esperança. Entre as promessas, o anúncio do Messias na cidade de Belém (BP).

Com o tema “Para que n’Ele nossos povos tenham vida” e o lema “Praticar a justiça, amar a misericórdia e caminhar com Deus”, a CNBB oferece um Texto-Base e um Roteiro de “Encontro Bíblicos” com textos e celebrações, que você pode encontrar na Livraria das Irmãs Paulinas.

Estamos iniciando a Semana da Pátria com a realização da 22ª edição do Grito dos Excluídos. As Pastorais Sociais, os Organismos e Movimentos Sociais convocam toda a população para participar do Grito dizendo “não à redução das políticas sociais”; “não à retirada de direitos sociais”.

O tema principal do grito, ano após ano, tem sido a defesa da vida. Neste ano será evidenciada a defesa da “vida em primeiro lugar”. O lema “Este sistema é insuportável: exclui, degrada, mata” tem como base uma frase do Papa Francisco citada no II Encontro dos Movimentos Sociais (Bolívia) que se refere aos problemas sociais e ambientais do modelo capitalista de produção.

Com o impeachment, “a ruptura num processo político que primava pela defesa de direitos, políticas sociais ampliadas e um profundo respeito aos valores democráticos” nos faz entrar em comunhão com as palavras de Dom Milton Kenan (bispo de Barretos) quando reafirma nossa missão de pastor: é preciso estar “unido ao povo na reconquista de seus direitos; o desafio da Igreja hoje é ajudar o povo a perceber os riscos que correm e se organizar para retomar lutas de 30 anos atrás”.

Portanto, o momento não é de desânimo. A crise política e econômica pela qual passamos deve ser propulsora de novas mudanças. Para a diretoria e coordenação do Ibase, este é o momento de traçarmos novos caminhos, de denunciarmos este absurdo retrocesso, de rever erros e acertos e fundamentalmente, de se ampliar a atuação política e fortalecer a cidadania ativa que venha contribuir para estruturação das bases sociais que serão, de fato, os grandes agentes de mudança de nossa sociedade.

Devemos reencontrar aquilo que nos une na diversidade do que somos e desejamos, descobrindo que temos mais visões e propostas comuns do que as que nos separam.

Em um contexto de perseguições, na liturgia de hoje, Cristo expressa aos seus seguidores exigências demasiado radicais, visando despertar e encorajar aqueles que se mantinham firmes na fé, até à morte (Lc 14,25-33).

Os exemplos utilizados por Jesus, para o teólogo Antonio Pagola, são diferentes, mas seus ensinamentos são os mesmos: quem empreende um projeto importante de forma temerária, sem avaliar antes os meios e forças para alcançar o que pretende, corre o risco de acabar fracassando.

À primeira vista, pode parecer que Jesus convida para um comportamento prudente e precavido, muito afastado da audácia com que fala habitualmente aos seus. Nada mais afastado da realidade. A missão que quer encomendar aos seus é tão importante que ninguém deve comprometer-se nela de forma inconsciente, temerária ou presunçosa.

Sua advertência ganha grande atualidade nestes momentos críticos e decisivos para o futuro da nossa fé. Jesus chama, em primeiro lugar, a uma reflexão madura: os dois protagonistas das parábolas devem se sentar para refletir. Seria uma grave irresponsabilidade viver hoje como discípulos de Jesus, que não sabem o que querem, nem onde pretendem chegar, nem com que meios devem trabalhar.

Quando iremos sentar para juntar forças, refletir juntos e procurar entre todos os caminhos aquele que temos de seguir? Não necessitaremos dedicar mais tempo, mais escuta do evangelho e mais meditação para descobrir chamadas e cultivar um estilo renovado de quem segue Jesus?

Ontem e hoje, o seguimento de Jesus é um desafio. Um dos homens do nosso tempo que denunciou a injustiça e carregou a cruz junto com seu povo sofrido foi dom Oscar Romero, que nos deixou sua mensagem profética:

Há um critério para saber se Deus está perto de nós ou se está longe: todo aquele que se preocupa com o faminto, com o maltrapilho e o pobre, o desaparecido, o torturado, o prisioneiro, com todos esses corpos, que sofrem, está perto de Deus. “Chamarás o Senhor e Ele te escutará”. A religião não consiste em rezar muito. A religião consiste nessa garantia de ter meu Deus perto de mim porque faço o bem aos meus irmãos. A garantia de minha oração não está em dizer muitas palavras; a garantia de minha prece é muito fácil de conhecer: como me comporto com o pobre? Por que ali está Deus (5/2/1978).

* O conteúdo opinativo acima é de inteira responsabilidade do colaborador e titular desta coluna. O Portal Gente de Opinião não tem responsabilidade legal pela "OPINIÃO", que é exclusiva do autor.

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