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A LENDA DO IPÊ



Por William Haverly Martins

A árvore símbolo do Brasil, embora feita poste pela estupidez humana, floresceu vistosa mais uma vez: anos de inércia, servindo de suporte de linhas de transmissão de energia elétrica e desabrochou no meio do emaranhado de fios e garras de metal, inundando de beleza os moradores da Zona Sul da cidade, nem o mais otimista dos biólogos poderia imaginar que isto um dia pudesse acontecer. Há vários anos, no mês de agosto, a floração se repete.A LENDA DO IPÊ - Gente de Opinião

Impossível não parar o carro quando a gente vem pela Avenida Jatuarana, sentido oeste - leste, já na entrada do bairro Cohab, e se depara com uma cascata de cachos amarelos, feito ramalhetes de ouro pendentes do ipê que era poste e virou árvore, como um caso raro de reencarnação vegetal: morreu perfumando o machado que o feriu no início da década de oitenta e ressuscitou, mais de vinte anos depois, chorando suas folhas verdes, mas segurando os buquês de flores amarelas depositado em seus galhos pelo casal de índios Carajás da lenda do norte do Amazonas, em agradecimento pelo fim da esterilidade.

Se estivéssemos no Sudeste a lenda seria outra: o último estágio do cinzento e triste inverno permite o alvoroço das vaidosas árvores a se enfeitarem de botões das mais variadas formas e cores, prenunciando a primavera. Diferente do resto da criação vegetal, os ipês continuavam com seus galhos secos, pareciam mortos, como o poste da Cohab, aí então, os canários da terra, incomodados com a tristeza marrom, lá instalaram seus ninhos, sendo seguidos por outras aves coloridas. Alegres com a companhia e os piados da procriação, os ipês, adeptos da simbiose perfeita, pediram ajuda à Providência Divina: receberam flores em abundância, amarelas como forma de agradecimento ao gesto carinhoso dos canários e de outras cores e matizes conforme a cor dos outros pássaros.

Por aqui o inverno de agosto é feito de poeira, fumaça de queimadas irracionais, baixa umidade e mormaço quase insuportável, mas quadro como este da Jatuarana com o bairro Cohab é um colírio para os olhos da alma, ameniza todo e qualquer desconforto causado pela interferência humana na natureza.

O doido do motosserra, famoso pelas estradas de Jaru, símbolo de uma época de ganância compulsiva, de consumismo insaciável, de progresso à custa de derrubadas estúpidas, de certa forma, foi contido no presídio do ecossistema, administrado pela parcela verde da consciência da sociedade, enfim estamos compreendendo a Terra como nossa única morada.

Rondônia possui uma natureza que, quando não agredida pela cobiça humana, derrama sobre seus habitantes e turistas jóias naturais de altíssimo quilate, basta educar o olhar com os princípios da preservação e da beleza, cuidando de não pisar no tapete de pétalas amarelas, roxas, rosas, brancas: as lágrimas do ipê, como na lenda do caçador que queria exterminar todas as árvores do planeta e foi transformado num ipê, nos servem de advertência, ao tempo em que nos remetem a paródia de uma frase famosa - o preço do verde é a eterna vigilância.

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Detalhes biográficos: baiano de nascimento, mas rondoniense de paixão, cursou Direito na UFBA e licenciou-se em Letras pela UNIR, é professor, escritor, membro efetivo da ACRM – Associação Cultural Rio Madeira e ocupa a cadeira 31 da Acler – Academia de Letras de Rondônia.             

 

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